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As comunas também combatem a Covid-19 na Venezuela

Na Comuna Socialista El Panal 2021, em Caracas, «a resposta ao vírus foi imediata», com a produção de milhares de máscaras. O acesso à alimentação está a ser acautelado através do projecto «Pueblo a Pueblo».

Entrada da Comuna Socialista El Panal 2021, em Caracas
Entrada da Comuna Socialista El Panal 2021, em Caracas Créditos / Sul21

Na Venezuela, as comunas constituem uma importante alavanca na prevenção, no combate e na organização social face à pandemia da Covid-19.

Para além disso, criaram alternativas para fintar a crise económica – num país onde as sanções impostas fazem mossa – e a paralisação dos serviços durante a quarentena decretada pelo Estado. A reportagem é da jornalista Michele de Mello, do Brasil de Fato.

Comuna Socialista El Panal 2021

Aqui, a resposta ao vírus foi imediata, pois a empresa de produção social directa «Las Abejitas del Panal» começou a confeccionar máscaras de protecção – 2500 numa semana, com matéria-prima da própria comuna.

«Procurámos as pessoas mais idosas e que tinham problemas respiratórios como prioridade. Entendendo que o ser humano é mais importante que o capital, nós colocámos todos os nossos recursos, as nossas máquinas de costura, que neste momento são as nossas armas, colocámos as nossas máquinas ao serviço do nosso povo e começámos a trabalhar», disse à reportagem José Lugo Barreto, representante da Comuna.

Na empresa «Las Abejitas del Panal», militantes da comuna trabalham para garantir que todos terão acesso a uma máscara de protecção / Ministério de Comunas

Ao conhecer a iniciativa, o governo bolivariano, através do Ministério das Comunas, decidiu atribuir-lhes matéria-prima para a produção de cinco mil máscaras semanais, num total 20 mil até ao fim de Abril.

Além da confecção de máscaras, na El Panal 2021 há várias outras iniciativas relacionadas com a quarentena decretada pelo governo de Nicolás Maduro. Por exemplo, grupos de professores estão a criar actividades escolares e de recreação para manter as crianças a estudar nesta fase – e levam as tarefas porta a porta.

As escolas da comuna têm um programa de alimentação para os jovens. No entanto, com a suspensão das aulas, os alimentos têm sido usados em refeições para toda a comunidade. Cerca de 200 famílias recebem marmitas diárias, distribuídas de casa em casa por membros da comuna.

Plano «Pueblo a Pueblo»

Os alimentos que abastecem as escolas da Panal 2021 vêm da articulação com comunas de regiões rurais da Venezuela, através do plano «Pueblo a Pueblo» [Terra a Terra]. O projecto, criado em 2014, visou estabelecer uma forma de acabar com intermediários, preços altos e burocracia no escoamento da produção agrícola e abastecimento dos que mais precisam.

O objectivo é reforçar a organização social da produção e da distribuição, bem como gerar uma mudança no padrão de consumo. A produção no campo define-se de acordo com a estação do ano e com base nas necessidades dos consumidores. Um dos princípios é o de que o alimento é um direito humano e não pode ser considerado uma mercadoria.

Depois de descarregar o camião do «Pueblo a Pueblo,» os membros da comuna El Panal 2021 pesam e separam os alimentos / Plano «Pueblo a Pueblo»

Os fundadores do projecto ajudam os trabalhadores do campo a calcular os custos de produção e a planear as colheitas. Nas zonas urbanas, ajudam a realizar censos nas comunas para conhecer a população local e definir os alimentos que serão cultivados.

Assim que a Covid-19 foi decretada como pandemia global, os coordenadores do projecto decidiram aumentar os centros de armazenamento de alimentos e começar a fazer a distribuição de comuna em comuna, para que os militantes de cada uma façam a entrega dos alimentos casa a casa.

Já existem centros de recolha na cidade de Barquisimeto, capital do estado de Lara, e na região de Carache, no estado de Trujillo. Agora, com a pandemia, está a ser construído um terceiro armazém, em Caracas.

Mais produção e melhor distribuição

«O objectivo é que cada comuna tenha o seu armazém, com alimentos suficientes para pelo menos um mês. Essa é a nova modalidade de organização, porque antes, aos sábados, os camiões passavam nas comunas e, numa manhã, era tudo distribuído. Agora, teremos de dois a quatro dias para distribuir a comida nos centros de recolha», explica Ricardo Miranda, matemático e um dos fundadores do «Pueblo a Pueblo».

Actualmente, são distribuídas 20 toneladas de alimentos semanalmente a comunas da região metropolitana da capital. «É a agricultura familiar que está a dar a cara. E, ainda que pareça contraditório, agora as pessoas estão a produzir mais, porque essa é a lógica do nosso povo. Nesta situação há que produzir mais», disse Ricardo Miranda.

Trabalhadores carregam um camião no centro de recolha no estado de Lara e que vai levar alimentos às comunas de Caracas / «Pueblo a Pueblo»

Há 140 famílias camponesas envolvidas, que cultivam cerca de 80 hectares nos estados de Lara, Yaracuy, Trujillo, Portuguesa e Cojedes. Cerca de 80% da produção é orgânica e, nos últimos quatro anos, colheram 2000 toneladas de frutas, hortaliças, fornecendo alimentos a 350 mil famílias em zonas rurais e urbanas.

Em aliança com o Ministério da Alimentação, o «Pueblo a Pueblo» já abastecia 44 escolas, beneficiando cerca de 10 mil crianças. Agora, com uma nova parceria, pretende chegar a 120 escolas só no Distrito Capital, com o chamado «Combo para la Vida» – conjunto de cinco a sete tipos de frutas, legumes e vegetais da estação.

Ao todo, estima-se que 3000 famílias, que moram em 42 comunas, estejam ligadas a este projecto nos estados de Aragua, Lara, Yaracuy, Portuguesa, Trujillo, Cojedes, Carabobo e no Distrito Capital. Só em Caracas, 15 comunas estão a ser atendidas pelo «Pueblo a Pueblo», com distribuição semanal, quinzenal ou mensal de alimentos.

Nas comunas, o princípio central é o bem da comunidade. O que liga uma comuna a outra e a projectos como o plano «Pueblo a Pueblo» é o ideal de construção de uma nova forma de fazer economia e de se relacionar. Ricardo Miranda entende que o momento de crise pode demonstrar a força popular.

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