O Ministério da Saúde palestiniano em Gaza lançou esta segunda-feira uma Campanha de Solidariedade Global para as Crianças de Gaza, informa o Al-Mayadeen.
Em conferência de imprensa realizada no Complexo Médico Nasser, em Khan Yunis, os responsáveis de saúde, juntamente com organizações não-governamentais (ONG) e representantes dos mídia, expuseram a catastrófica condição vivida pelas crianças de Gaza e apelam a uma intervenção internacional imediata para as salvar.
Foi sublinhada a urgente necessidade de alimentos, medicamentos e medidas protectoras para aquela que é a população mais vulnerável do território. Os oradores enfatizaram não ser este um apelo simbólico mas um apelo mundial à acção dirigido aos governos, aos jornalistas e à sociedade civil, para que se unam na condenação ao genocídio em curso, pondo fim à fome forçada imposta pelo bloqueio em curso e preservando, assim, os direitos e as vidas das crianças de Gaza.
O ministro da Saúde reforçou o apelo, afirmando que «salvar as vidas das crianças de Gaza não se trata de uma opção mas sim de um urgente e moral imperativo humanitário».
Sistema de saúde em colapso agrava a fome sob o bloqueio
A autoridade sanitária emitiu um sério aviso sobre o desastre humanitário, em rápido desenvolvimento, que a política da fome aplicada pelo ocupante israelita faz impender sobre mais de dois milhões de pessoas. Há mais de dois meses que os postos fronteiriços entre o Estado de Israel e a Faixa de Gaza permanecem encerrados para bens alimentares e medicamentos, enquanto o acesso à água é deliberadamente cortado, aprofundando a crise humanitária em curso.
Gaza vive uma tão catastrófica situação de saúde e humanitária que deixa as organizações internacionais na impossibilidade de salvar vidas, afirmou o ministro, que confirmou a morte de 16 278 crianças no território – uma criança a cada 40 minutos desde o início da operação militar israelita. Além disso, sublinhou, contam-se 311 crianças nascidas e mortas no mesmo período, daí ressaltando a extrema vulnerabilidade dos recém-nascidos por entre as atrocidades em curso.
A destruição generalizada de centros de cuidados primários tem deixado sem assistência médica tanto crianças como grávidas. A falta de mais de 50% dos medicamentos essenciais aos cuidados materno-infantis, incluindo suplementos terapêuticos, vitaminas e vacinas, introduz mais um factor de pressão sobre a já débil infra-estrutura sanitária. A continuada obstrução, pelos ocupantes sionistas, à entrada de vacinas contra a poliomielite, ameaça colapsar as campanhas de prevenção do Ministério da Saúde palestiniano.
Os dias mais longos
Há mais de 60 dias que o Estado de Israel impôs um bloqueio total à entrada de ajuda humanitária na Faixa de Gaza – incluindo alimentos, água, medicamentos, combustível e materiais para abrigos. Trata-se do período mais longo em que o território palestiniano vê bloqueada toda a ajuda humanitária, desde que Israel invadiu o território palestiniano, em represália pelo ataque do Hamas a 7 de Outubro de 2023, escreve o Times of Israel (TOI).
Há dados e testemunhos que apontam para um agravamento da fome e para o aumento dos casos de má nutrição e um residente de Gaza, sob anonimato, declarou ao jornal que «a fome é extrema» e que esta atinge «proporções inaturais».
Mas já antes do bloqueio, iniciado a 2 de Março deste ano, a assistência humanitária faltava a muitos gazanos.
Segundo um relatório do Gabinete para a Coordenação de Assuntos Humanitários da Organização das Nações Unidas (OCHA), um inquérito realizado após essa data, em 256 campos de refugiados representando 40 mil famílias palestinianas, revelou que 68% das mesmas não tinham recebido qualquer ajuda nos 30 dias anteriores, ou seja, estão há mais de 90 dias nessa situação.
Entretanto, a escassez de alimentos fez disparar os preços e, segundo outro inquérito, realizado pelo Programa Alimentar Mundial (PAM), os preços em Abril eram 740% superiores aos praticados em Fevereiro, durante o cessar-fogo. E alguns alimentos básicos, como ovos, fruta ou carne, estão simplesmente indisponíveis.
Morrer de fome em Gaza
Peritos citados pelo TOI consideram que os problemas causados pela fome generalizada sejam sentidos de uma forma mais aguda pelos mais vulneráveis. Nas primeiras duas semanas de Abril, segundo a OCHA, 64 crianças foram diagnosticadas com má nutrição aguda severa e 641 com má nutrição aguda moderada, isto num num universo, parcial, de 21 mil crianças.
Israel proibiu jornalistas internacionais de entrarem na Faixa de Gaza para reportarem de uma forma independente mas, no mesmo hospital em que decorria a conferência de imprensa do Ministério da Saúde de Gaza, um correspondente local da britânica BBC encontrou Siwar Ashour, uma bebé de cinco meses, e sua mãe Najwa, de 23 anos.
A bebé tenta chorar, mas a sua voz não tem força para tal e o que o jornalista relata ouvir é um som rouco. A menina pesa pouco mais de dois quilos, mas, com esta idade, deveria ter pelo menos seis. A mãe, enquanto muda a fralda de Siwar, conta que não consegue amamentar a filha devido à escassez de alimentos durante o período de gravidez.
A correspondente da BBC filmou os sinais inconfundíveis de desnutrição avançada no corpo de Siwar. A cabeça que parece demasiado grande para o seu corpo. Os braços e as pernas magríssimos. As costelas que lhe pressionam a pele quando tenta chorar. Os grandes olhos castanhos que acompanham cada pequeno movimento da mãe.
A menina apenas bebe leite em pó, mas, segundo o seu médico, o doutor Ziad al-Majaida, «nada passa na fronteira, nem leite, nem alimentos, nem nada». O hospital está a tentar obter novos abastecimentos mas Siwar está fraca e sofre de constante diarreia. «Se continua assim a sua vida ficará em perigo», prevê o médico.
O prosseguimento do bloqueio intensificou a aguda desnutrição infantil em Gaza e já deu origem a casos mortais.
O número de crianças mortas de fome ou de patologias decorrentes subiu para 57, segundo os dados do Ministério da Saúde palestiniano, citados pelo Al-Mayadeen. A estes números devem acrescentar-se as crianças mortas durante bombardeamentos sionistas a cozinhas humanitárias onde mães e filhos tentavam obter algum alimento.
A situação é sem precedentes, sublinha o Ministério da Saúde, que exige uma acção urgente, coordenada e global, para deter o genocídio, levantar o bloqueio e proteger as crianças de Gaza de mais sofrimentos.
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