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Mário de Carvalho: «Nem tudo o que vem de antes é clássico»

O escritor, que acaba de lançar o seu livro de memórias «De Maneira que é Claro», um conjunto de pequenos relances, aleatórios, da sua vida, revela ao AbrilAbril que não se mostra preocupado com o futuro dos grandes clássicos da literatura.

Mário de Carvalho 
Mário de Carvalho Créditos / Mário de Carvalho

«A questão é que os meus alunos de Oxford, de Cambridge, os de Genebra e de Harvard já não sabem o que significa ‘Roncevaux’. A próxima edição terá de trazer uma nota de rodapé, que destrói completamente o propósito da palava», lamentava-se George Steiner, numa entrevista ao programa holandês, O Belo e a Consolação. «No tempo do Ernest Hemingway, com a sua vasta audiência, era um romance muito popular, em que se podia assumir que Roncevaux era tudo o que era preciso dizer».

Roncevaux é um lugar de passagem nos Pirenéus, no País Basco, onde terá sido morto o cavaleiro Rolando com os seus paladinos, atraiçoados quando retornavam a França na traseira do exército de Carlos Magno. Esta história deu origem ao primeiro romance de cavalaria que nos chega aos dias de hoje, A Canção de Rolando.

O AbrilAbril conversou com o escritor Mário de Carvalho sobre o papel que os clássicos da Literatura ainda podem desempenhar nos dias de hoje.

As notas de rodapé limitam, de alguma forma, a experiência de leitura de um texto literário? Não será inevitável que textos com várias centenas de anos percam alguma da sua actualidade?

As notas de rodapé (desde que criteriosas) podem ser um auxiliar de leitura importante. Esclarecem sobre personagens, situações, cronologias e outros elementos que podem ser fundamentais para uma plena compreensão do texto. A actualidade acrescenta sempre qualquer coisa aos textos mais antigos. Se algo se perdeu com o correr os anos, algo se ganha também com uma experiência de leitura acrescida.

Não pode também demonstrar que algumas formas de expressão, estéticas, morais, formais, estão ultrapassadas? O etnomusicólogo Anthony Seeger considera inevitável que todas as formas de expressão cultural acabem por se tornar irrelevantes, que "morram" de certa forma..

A arte não morre. Não cabe, em termos artísticos, a linguagem automobilística da 'ultrapassagem'. Certas formas vêm ao de cima em certas épocas, são mais ou menos apreciadas, comentadas e vistas, mas, no fundo continuam lá, ao dispor de quem as procure.

Assumindo que a literatura nunca foi uma forma de expressão massificada como é hoje a música ou o cinema, cada Português compra, em média, pouco mais de um livro por ano, não lendo mais do que isso no mesmo período. Terá chegado ao fim o tempo dos clássicos?

Nem tudo o que vem de antes é clássico. Quando se fala em "clássico" queremos sobretudo significar aqueles textos de referência, de especial qualidade literária, que marcam uma época e que são indispensáveis para a nossa formação intelectual. E se (outra questão…) os portugueses lêem pouco, isso terá que ver com o descaso da grande comunicação social, com o bombardeamento de anúncios, numa sofreguidão da compra e venda, que não deixa lugar á reflexão e ao prazer estético.

Autores como o Aquilino Ribeiro, que andou esquecido durante umas décadas, exigem um grande compromisso por parte do leitor... O prazer estético da Grande Casa de Romarigães e das Terras do Demo conseguirá enfrentar essa «sofreguidão»?

Não creio que Aquilino tenha estado tão esquecido como isso. Continuou sempre a ser lido e apreciado por bons leitores da Língua Portuguesa. Nem sempre foi o caso dos comentadores de jornal, cujo escasso alcance o omitia. Daí, do silêncio duma alheada comunicação social, a tal impressão de 'esquecimento'. Mas parece – espero não estar enganado – haver agora, por aí, uma nova geração mais informada, mais a par da nossa secular literatura.

Como é que uma geração formada nas redes sociais, que desenvolveu uma forma muito própria de se relacionar na internet, através de vídeo, imagem e som, uma sociedade do momento, dedicada quase exclusivamente ao fugaz, pode recuperar o interesse pelas velhas e universais verdades da literatura clássica?

Em primeiro lugar, entrando em contacto com elas, ultrapassando a sonegação que lhes é feita de uma abundante fonte de enriquecimento cultural. Por outro lado, tem-se demonstrado como os novos meios de comunicação podem ser, por um lado, um poderoso estímulo à descoberta e à leitura dos clássicos, por outro, eles próprios, beneficiários de ideias, argumentos, personagens, que um lastro histórico lhes oferece.

Que nomes da literatura portuguesa do séc. XX considera serem imprecindíveis para o nosso cânone? Já aqui mencionámos Aquilino Ribeiro...

José Cardoso Pires, Maria Velho da Costa, José Saramago, Nuno Bragança, Manuel da Fonseca, Carlos de Oliveira...

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