Longe vão os tempos em que se falava da falta de representatividade juvenil nos espaços de comentário político. Recentemente, esse problema foi sanado e os órgãos de comunicação social conseguiram encontrar os únicos jovens que, aparentemente, existem. Andavam escondidos na camada oprimida da fina flor do comentário no Twitter, mas finalmente foi-lhes consagrado um espaço mediático à altura das suas ambições, para poder dizer tudo aquilo que a sua geração quer dizer.
Bem, talvez não seja uma geração. Talvez seja o que a sua classe quer dizer. Dizem apenas o que é repetido em todo o lado pela narrativa dominante, mas fazem-no de uma forma muito descontraída, desapegada e alegadamente irreverente. O ar jovial conjugado com uma boa articulação discursiva, sem deixar de lado a testa franzida para aparentar seriedade, dá aos jovens premiados com este lugar de fala um passaporte para nada de importante acrescentar.
A reboque destes elementos vem a replicação de tudo o que já é dito em todos os espaços de comentário, inclusive praticar o mesmo tipo de revisionismo histórico e desonestidade intelectual. Veja-se o exemplo do mais recente podcast do Expresso, o «Lei da Paridade». Apresentado por Adriana Cardoso, hoje jovem «apartidária», mas que nasceu no seio da Iniciativa Liberal; Maria Castelo Branco, ex-militante da Juventude Popular, agora militante da Iniciativa Liberal e ex-jovem promessa; e Leonor Rosas, militante do Bloco de Esquerda e candidata à Assembleia da República pelo círculo eleitoral de Lisboa.
O podcast que teve o seu começo na TSF, regressou agora ao jornal de Pinto Balsemão. Neste importante retorno, até às eleições legislativas serão entrevistadas mulheres do BE, IL, PS, AD. Segundo Adriana Cardoso foram excluídos «evidentemente desta conta partidos que não são feministas». Uma escolha caricata já que são jovens que são vendidas como bem informadas, mas parece que deliberadamente se esqueceram do importante e determinante papel do PCP na luta emancipatória das mulheres ao longo dos seus mais de 100 anos de história.
Nas redes sociais, quando confrontada com este facto, Adriana Cardoso usa como argumento o facto de serem «os 4 partidos com mais intenção de voto» e não haver «espaço nem episódios infinitos até às próximas eleições». Um critério nunca antes visto. Uma escolha editorial clara que visa beneficiar determinados partidos e apagar outros. A suposta jovialidade é usada para repetir as manobras de apagamento e o revisionismo histórico.
Neste ramalhete temos ainda o caso de João Maria Jonet com espaço assíduo na SIC Notícias. Habilidoso com metáforas, supostamente irreverente, vende-se como um militante de base PSD com uma voz própria. É uma espécie de jovem Pacheco Pereira que, no momento certo, não hesita em esgrimir um conjunto chavões analíticos que dão jeito à narrativa dominante. Defende a NATO, define-se «americanista» e promove a União Europeia. Invoca sempre a social-democracia para aparentar a moderação, mas no final do dia, não falta à chamada dos projectos mais reaccionários e nebulosos como os de Luís Newton e Carlos Moedas.
Surge ainda o «jovem» Gaspar Macedo. As aspas não são inocentes. É que Gaspar Macedo, passista assumido e militante do PSD, parece ter saido de um governo de Cavaco Silva, arrancado por uma máquina do tempo directamente dos anos 80. Viralizou nas redes sociais com vídeos pequenos com música de fundo épica onde "debatia" contra alguém, sendo que estava sempre a falar sozinho. Nesses vídeos, falava do orgulho nacional, dos heróis da pátria desprezados, e em todas as teses de Nostradamus aplicadas à realidade nacional. No momento da responsabilização, sem colocar quais os reais problemas, apaga a responsabilidade do PSD e só sabe falar do PS. A CNN viu nele um pequeno Tucker Carlson e, neste momento, tem espaço de comentário com a Joana Amaral Dias.
Por fim, há ainda o já renomado Sebastião Bugalho. Jornalista reformado que quase exclusivamente escrevia sobre o partido da extrema-direita em Portugal (com dezenas de artigos sobre o assunto nos dois anos em que exerceu funções), integrou as listas do CDS-PP à Assembleia da República, a convite de Assunção Cristas, e tem actualmente espaço fixo de comentário na SIC Notícias e um podcast no Expresso. Apresenta-se como uma alma velha, algo que corresponde também à visão política que transpõe para o seu comentário. Recentemente comprou a heróica batalha de defender Diogo Pacheco de Amorim e de apagar os crimes do MDLP. Nas análises que fez aos debates, talvez por defender colégios privados, inflaccionou sempre as notas dadas dos candidatos dos partidos de direita. Cada análise do jovem Bugalho parece saída de um antiquário, cumprindo o papel que lhe foi destinado no grupo Impresa.
Parece que estes são os únicos jovens que existem no país. Quem não tem lugar de comentário é o jovem que não tem professor numa disciplina, que estuda na Escola Pública e está numa turma sobrelotada. Quem não tem lugar no espaço opinativo é o jovem que tem dificuldade a pagar as propinas, alojamento e alimentação. Quem não tem direito à palavra é o jovem que recebe o salário mínimo e tem um vínculo precário. Quem não interessa ouvir é o jovem que tem actividade sindical e se assume de esquerda. Quem é ignorado é o jovem que vê um mundo que pode ser transformado e dá a sua vida por essa transformação. Esses jovens não existem. Só existem seis jovens e nenhum deles é o jovem real. São, enfim, jovens de uma outra classe.
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