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|Festival Mundial da Juventude

Frieden, Freundshaft, Solidarität (Paz, Amizade, Solidariedade)

Com este lema decorreu há 50 anos, em Berlim, o X Festival Mundial da Juventude e dos Estudantes. Participaram cerca de 25 600 jovens de países de todo o mundo. A delegação portuguesa era composta por 70 jovens, 16 dos quais residiam no estrangeiro.

Créditos / António Abreu

O ano de 1973 foi, em Portugal, particularmente importante porque era visível que os fascistas estavam enfraquecidos, apesar de se sucederem as prisões e outros golpes repressivos, as lutas dos trabalhadores sucediam-se com maior impacto social, os movimentos de oposição conquistavam grande abertura apesar da semilegalidade em que actuavam, e os estudantes estiveram permanentemente em luta por reivindicações específicas, mas com uma politização crescente.

Tudo apontava para a queda do regime sem que, é claro, este objectivo aparecesse expresso como tal. O conhecimento difuso de uma movimentação entre os militares contra o regime era encorajante, mesmo que se tivesse a noção que os «ultras» do regime poderiam agir em sentido contrário.

A CDE [Comissão Democrática Eleitoral] manteve-se numa semi-legalidade desde as «eleições» de 1969 e eu, como seu activista de base, mantive actividades e relacionamentos que me permitiram não viver apenas nas «ilhas de liberdade» que eram as associações de estudantes. Foi nessa dinâmica da oposição democrática que surgiram as actividades preparatórias do III Congresso da Oposição Democrática que se realizara em Abril, na dinâmica do qual a Comissão Nacional Preparatória para o X Festival da Juventude e dos Estudantes desenvolveria, a partir da organização partidária, mas com uma grande abertura nas iniciativas.

Créditos

Saí num comboio para Paris. No meu grupo iam também a Margarida Vicente e a Teresa Gafeira, já minhas conhecidas da CDE de Lisboa, ambas estudantes de Belas Artes, tendo a Teresa seguido, depois, uma carreira teatral. Foi uma viagem em que nos passãmos a conhecer melhor, falámos e cantámos.

Quanto à viagem, uma parte dos participantes saiu de comboio para Paris em pequenos grupos, separados e em diferentes momentos. Vários não se conheciam ou mal se conheciam, pelo que a viagem foi uma oportunidade para se conhecerem melhor. Cantaram-se músicas da resistência.

Chegados a Paris, foram acolhidos por José Oliveira, a Helena Bruto da Costa e o Manuel Aranda da Silva, que estavam em contacto com o Comité Preparatório do Festival, e que recebiam os viajantes para com eles tratarem de questões de natureza logística, antes de todos seguirem para Berlim. 

A minha movimentação era restrita em Berlim, por razões de segurança que passavam por isso e por não participar nos desfiles, mesmo de cara tapada, como orientação para os 54 delegados que vinham do interior de Portugal.

Nunca fui impedido de circular por onde quisesse, incluindo no U-Bahn. Claro que os inquiri sobre a questão do muro e as razões que me avançaram pareceram-me então plausíveis. Vários troços do muro não tinham polícia e pareceram-me facilmente transponíveis, mas o que dava boas fotos para tirar efeito de algumas fugas era a proximidade do checkpoint Charlie, o mais conhecido da fronteira entre as duas partes da cidade.

Quanto à nossa delegação, era composta por jovens trabalhadores e estudantes, comunistas ou simpatizantes, com uma grande abertura de espírito e capacidade de conviver, entre si, e com as delegações com quem contactámos.

«Frieden, Freundschaft, Solidarität» e o hino da FMJD [Federação Mundial da Juventude Democrática] nunca mais nos saíram do ouvido. A combatividade e a unidade anti-imperialista eram ali tão naturais como o correr sereno das águas do Spree.

Ao fim do dia partilhava com outros camaradas, numa equipa coordenadora, a distribuição dos membros da delegação por iniciativas para as quais tínhamos sido convidados.

O momento mais emocionante foi um meeting de solidariedade num amplo salão em que participaram centenas de jovens portugueses, da Guiné-Bissau e Cabo Verde, de Angola e Moçambique.

Como a minha estada em Berlim coincidiu com o meu 26.º aniversário, tive o privilégio de, com outros festivaleiros, que faziam anos nesses dias, almoçar no restaurante rotativo da bola da magnífica torre de TV!

«"Frieden, Freundschaft, Solidarität" e o hino da FMJD [Federação Mundial da Juventude Democrática] nunca mais nos saíram do ouvido. A combatividade e a unidade anti-imperialista eram ali tão naturais como o correr sereno das águas do Spree.»

No regresso a Portugal, voltámos a vir aos bochechos em pequenos grupos e com a estrita indicação de não trazer quaisquer lembranças, no respeito de condições de segurança, que tinham que ser observadas, mesmo que isso fosse desagradável para todos. A mim calhou-me, na viagem de comboio, a companhia do saudoso Murad-Ali Mamadussen, militante da UEC, da Faculdade de Direito, que viria a ser ministro de Samora Machel e que morreria com ele no atentado ao avião quando sobrevoava o território sul-africano.

Estávamos a chegar a Santa Apolónia e o Murad-Ali levantou a camisa revelando por baixo uma t-shirt com a efígie do Amílcar Cabral. Eu ia-me passando e ele sorria... Muita água passou desde então nas margens do Spree.

Os países socialistas que tinham, começando pela URSS, dado um contributo decisivo para a derrota do nazi-fascismo, procederam à elevação das condições de vida(acesso a bens alimentares, à saúde, à educação, cultura e desporto, à segurança social) dos seus povos, ao exercício de vertentes da democracia que o pensamento liberal nunca reconheceu nem praticou. Constituíram-se também como um estímulo às conquistas sociais no resto do mundo, à coexistência pacífica contra novas guerras, à cooperação em múltiplos sectores. E deram um apoio muito importante à luta pela independência de países em todo o mundo.

Créditos

O mundo que alguns anunciavam melhor depois dos acontecimentos na Europa de leste de início dos anos 90 do século passado, revelou-se bem pior: novas guerras de agressão que mataram milhões de pessoas a que se associou o nascimento de diferentes grupos terroristas, a perda de direitos dos trabalhadores e o acentuar das desigualdades dentro de cada país, em cada um dos continentes e globalmente, a um desenvolvimento enorme daemigração de povos em zonas de conflito ou de grande fome endémica.

Os ideais de então não soçobraram com esse modelo de sociedade cujos precursores lutaram muito para ser alternativa ao capitalismo. Esse modelo, a partir de certa altura, não respeitou essas aspirações. E soçobrou, dando nova força ao sistema capitalista, que viria novamente a borregar por razões que lhe são intrínsecas.

Muitos dos jovens de então e de mais novas gerações têm um novo importante desafio, novos ideais, novos paradigmas numa luta que continuará, mesmo numa situação instável, com riscos de generalização das guerras actuais, com novos êxitos e ensinamentos para a construção de novas sociedades.

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