Mensagem de erro

User warning: The following module is missing from the file system: standard. For information about how to fix this, see the documentation page. in _drupal_trigger_error_with_delayed_logging() (line 1143 of /home/abrilabril/public_html/includes/bootstrap.inc).

|Espanha

Ainda a memória

É preciso estar nestes combates que se travam. Há que reconhecer a forma seletiva como se quer difundir no presente – porque há, claro está, agendas políticas – uma imagem, uma construção do passado.

Miradouro da Memória, El Torno, Cáceres
Miradouro da Memória, El Torno, CáceresCréditos / Turismo de Extremadura

Não é demais, sobretudo nos tempos que correm, relembrar a importância da memória face aos silêncios, às ausências, à desmemória, e, sobretudo, à vontade de amputar o passado, ou, pelo menos, uma parte desse passado. Porque a memória é, de facto, um campo de batalha. Por isso, ainda a memória e as questões que em torno dela se levantam. Por isso, voltar uma outra vez a este tema. Quantas vezes forem necessárias.

No passado dia 12 de julho foi tornado público o Manifesto pela Dignidade e Memória na Estremadura [Manifiesto por La Dignidad y la Memoria en Extremadura]. É uma tomada de posição clara sobre o que se anuncia em relação às políticas de memória. E não é, apenas, uma questão que se relacione com o contexto da Estremadura ou de Espanha.

Perante o acordo de governo para a Junta de Extremadura, assinado entre o PP e o VOX, um coletivo de várias associações, cidadãos e cidadãs rejeitam o anúncio da revogação das «políticas institucionais e os projetos públicos que foram laboriosamente alcançados na região após tantas décadas de esquecimento, especialmente a Lei 1/2019, de 21 de janeiro, sobre a memória histórica e democrática da Extremadura (...)». Como reconheceu a própria lei, não se podia deixar de resgatar «uma imensa maioria» de represaliados, os que, de uma «forma intencional» foram mergulhados no mais «profundo esquecimento».

Falamos de um longo período de violência: depois do golpe de 17 de julho de 1936 contra o governo legítimo, «mais tarde a causa da Guerra Civil», em tempos dessa repressão de uma «magnitude extraordinária» levada a cabo pelo franquismo. Afinal, além do direito de se saber as circunstâncias da morte de tantas mulheres e de tantos homens, também o de saber o local onde estão os restos mortais «de um incontável número de desaparecidos», de modo a permitir uma sepultura digna.

Afinal, o silêncio pode estar prenhe de injustiças.

O manifesto congrega o Movimento pela Memória Histórica e Democrática de Extremadura, vinte associações, mulheres e homens da história, da antropologia e da arqueologia e, ainda, toda a cidadania sensível ao sofrimento daqueles que foram represaliados «por motivos políticos, ideológicos, sindicais, religiosos, de género ou de identidade e orientação sexual durante a ditadura» franquista.

É preciso estar nestes combates que se travam. Há que reconhecer a forma seletiva como se quer difundir no presente – porque há, claro está, agendas políticas – uma imagem, uma construção do passado. Como bem se relembra e reitera no manifesto, a memória das vítimas «de qualquer conflito ou repressão» está diretamente relacionada com «os direitos humanos e os princípios de verdade, justiça, reparação e garantia de não repetição (...)». Portanto, esta questão está diretamente relacionada com o presente. O nosso presente.

Relembra-se também, no mesmo documento, que «nenhuma pessoa justa» se deveria esquecer que «durante os quarenta anos da ditadura franquista» se glorificaram apenas alguns, apenas «uma parte das vítimas do golpe de Estado e da Guerra Civil». Sabemo-lo: há razões ideológicas nesse esquecimento e na desmemória. Serviram os tempos de ditadura. Servem agora neste novo contexto político de crescimento da extrema-direita.

Mas se o poder construía e monumentalizava a sua versão, também é certo que as memórias, todas as outras memórias não foram erradicadas.

Afinal, se a concórdia é desejável, não se podem manter feridas abertas.

«Mas se o poder construía e monumentalizava a sua versão, também é certo que as memórias, todas as outras memórias não foram erradicadas.»

Campo de batalha. Porque estes combates não são um único evento, mas um processo. Não pensemos que alguma coisa está definitivamente conquistada. Não são estes os tempos em que isto se torna ainda mais evidente?

Há que ter força. Não se desiste da restituição da dignidade. Mesmo quando tudo parece sombrio, mesmo quando há outras forças políticas a destruírem o que até agora foi feito. Há que ter força. Porque não estamos sozinhos.

«Quienes niegan que el derecho a la memoria sea un derecho humano, patrimonio de la ciudadanía, parecen no darse cuenta de que seguiremos ejerciéndolo, aunque no haya leyes, porque el proceso de recuperación de la memoria histórica y democrática es un movimiento popular, de la sociedad civil, que jamás erradicarán.

En Extremadura, a pesar de PP y Vox, desde el movimiento por la MEMORIA HISTÓRICA Y DEMOCRÁTICA seguiremos hablando del franquismo, seguiremos dignificando a las víctimas, seguiremos recordándoles la historia, seguiremos haciendo memoria.»

Em rigor, isto não é, apenas, sobre o que se passa ao nosso lado, na Estremadura. É aqui. É sempre aqui, também. Nada disto nos deveria ser estranho ou indiferente. É sobre todos nós.


A autora escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

Tópico

Contribui para uma boa ideia

Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.

O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.

Contribui aqui