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|Palestina

A guerra de Israel contra a Palestina e a revolta mundial contra ela

Nenhuma tentativa das empresas de redes sociais de virar o algoritmo contra os palestinos foi bem sucedida, nenhuma tentativa de proibir os protestos – nem mesmo a proibição da exibição da bandeira palestina – funcionou.

Com uma participação que pode exceder as 800 mil pessoas, segundo estimativas dos organizadores, a marcha realizada hoje, 11 de Novembro, em Londres, Inglaterra, de solidariedade com a Palestina, terá sido a maior manifestação em defesa da paz no país desde a invasão do Iraque, em 2003. Suella Braverman, Secretária de Estado para Assuntos Internos do Reino Unido, considerou que se tratava de uma «marcha de ódio», incentivando os contra-protestos violentos por parte da extrema-direita. 
CréditosWiktor Szymanowicz / Anadolu

Centenas de milhões de pessoas em todo o mundo ficaram profundamente comovidas com as atrocidades da guerra israelita contra a Palestina. Milhões de pessoas participaram de marchas e protestos, muitas delas envolvendo-se em tais manifestações pela primeira vez nas suas vidas. As redes sociais, em quase todas as línguas do mundo, estão saturadas de memes e posts sobre esta ou aquela ação terrível.

Algumas pessoas concentram-se no ataque israelita às crianças palestinas, outras no ataque ilegal às infraestruturas de saúde de Gaza, e outras ainda apontam para a aniquilação de pelo menos quatrocentas famílias (mais de dez pessoas mortas em cada família). O foco de atenção não parece estar a diminuir. As férias de dezembro passaram, mas a intensidade dos protestos e das mensagens manteve-se constante. Nenhuma tentativa das empresas de redes sociais de virar o algoritmo contra os palestinos foi bem sucedida, nenhuma tentativa de proibir os protestos – nem mesmo a proibição da exibição da bandeira palestina – funcionou. As acusações de antissemitismo caíram por terra e as exigências de condenação do Hamas foram rejeitadas. Este é um novo estado de espírito, um novo tipo de atitude em relação à luta palestina.

Nunca antes, nos últimos 75 anos, houve uma atenção tão constante à causa dos palestinos e à brutalidade israelita. Desde 2006, Israel lançou oito campanhas de bombardeamento contra Gaza. E Israel construiu toda uma estrutura ilegal contra os palestinos em Jerusalém Oriental e na Cisjordânia (um muro de apartheid, assentamentos, postos de controle). Quando os palestinos tentaram resistir – seja através de ações cívicas ou da luta armada – enfrentaram imensa violência por parte dos militares israelitas. Desde que as redes sociais passaram a existir, imagens do que ocorre na Palestina têm circulado, incluindo a utilização de fósforo branco contra civis em Gaza, a detenção e o assassinato de crianças palestinas em todo o Território Ocupado da Palestina. Mas nenhum dos anteriores atos de violência evocou o tipo de resposta de todo o mundo como esta onda de violência que começou em outubro de 2023.

Genocídio

A violência armada israelita contra Gaza desde outubro tem assumido uma forma qualitativamente diferente de qualquer violência anterior. O bombardeamento de Gaza foi cruel, com aviões israelitas atingindo áreas residenciais sem qualquer preocupação com a vida dos civis. O número de mortos aumentou dia a dia a um ritmo nunca antes visto. Depois, quando as forças terrestres israelitas entraram em Gaza, realizaram uma expulsão ilegal em massa dos civis palestinos das suas casas e empurraram-nos cada vez mais para sul, em direção à fronteira com o Egito. Os israelitas violaram as suas próprias promessas de «zonas seguras», atingindo áreas mais densamente povoadas do que antes, devido ao deslocamento interno.

«Os israelitas violaram as suas próprias promessas de "zonas seguras", atingindo áreas mais densamente povoadas do que antes, devido ao deslocamento interno.»

Foi esta escala de violência que provocou a utilização precoce do termo «genocídio» para descrever o que estava a acontecer em Gaza. No início de janeiro, mais de 1% de toda a população palestina em Gaza tinha sido morta, enquanto mais de 95% tinha sido deslocada. O tipo de violência utilizado neste caso não foi visto em nenhuma guerra contemporânea, nem no Iraque (onde os EUA desrespeitaram a maioria das leis de guerra), nem na Ucrânia (onde o número de civis mortos é muito menor, apesar de a guerra já durar dois anos).

O ritmo dos protestos de massa levou o governo da África do Sul a apresentar uma disputa na Corte Internacional de Justiça (CIJ) contra Israel pelo crime de genocídio. Ambos os países são signatários da Convenção contra o Genocídio de 1948 e a CIJ é a instância competente para a solução de controvérsias. O processo de 84 páginas apresentado pelo governo sul-africano documenta muitas das atrocidades perpetradas por Israel e também, o que é crucial, as palavras de altos funcionários israelitas. Nove páginas deste texto (pp. 59 a 67) listam as autoridades israelitas nas suas próprias palavras, muitos deles apelando a uma «Segunda Nakba» ou a uma «Nakba contra Gaza», um uso do termo «Nakba» ou Catástrofe que se refere à Nakba de 1948, a expulsão dos palestinos das suas casas, que levou à criação do Estado de Israel.

São palavras assustadoras, e têm sido amplamente utilizadas desde outubro. O linguajar racista sobre «monstros», «animais» e a «selva» marca os discursos e as declarações destas autoridades do governo israelita. O ministro da Defesa de Israel, Yoav Gallant, disse em 9 de outubro de 2023 que as suas forças estão «impondo um cerco completo a Gaza. Sem eletricidade, sem comida, sem água, sem combustível. Tudo está fechado. Estamos combatendo animais humanos e estamos agindo de acordo». Isto, em conjunto com o caráter dos ataques militares israelitas, é suficiente como referência para a acusação de genocídio. Na audiência na CIJ, Israel não conseguiu responder de forma credível à queixa da África do Sul.

Foi uma combinação das imagens de Gaza e das palavras destes altos funcionários israelitas – com total apoio do governo dos Estados Unidos e de muitos governos de países europeus – que provocou a raiva e a desesperança que impulsionaram estes protestos em massa.

Legitimidade

Ao longo dos últimos dois anos – desde o início da guerra na Ucrânia até agora – houve um rápido declínio da legitimidade do Ocidente, especialmente dos países da NATO (Organização do Tratado do Atlântico Norte), liderados pelos Estados Unidos. Essas guerras não são a causa desta queda de legitimidade, mas aceleraram o declínio da legitimidade dos países da NATO, particularmente no Sul Global.

«Sem eletricidade, sem comida, sem água, sem combustível. Tudo está fechado. Estamos combatendo animais humanos e estamos agindo de acordo.»

ministro da Defesa de Israel, Yoav Gallant

Desde o início da Terceira Grande Depressão, em 2007, o Norte Global tem perdido lentamente o seu domínio sobre a economia mundial, sobre a tecnologia e a ciência e sobre as matérias-primas. Os bilionários do Norte Global aprofundaram a sua «greve fiscal» e transferiram uma grande parte da riqueza social para paraísos fiscais e para investimentos financeiros improdutivos. Isso deixou o Norte Global com poucos instrumentos para manter o poder económico, incluindo para investimentos no Sul Global. Esse papel foi lentamente assumido pela China, que vem reciclando os lucros globais em projetos de infraestrutura em todo o mundo. Em vez de contestar a Iniciativa «Cinturão e Rota» da China, por exemplo, através do seu próprio projeto comercial e económico, o Norte Global procurou militarizar a sua resposta com gastos maciços (três quartos dos gastos militares globais são dos Estados da NATO). O Norte Global utilizou a Ucrânia e Taiwan como alavancas para provocar a Rússia e a China em conflitos militares, de modo a «"enfraquecê-las», em vez de contestar o crescente poder energético russo e o poder industrial e tecnológico chinês através do comércio e do desenvolvimento.

«Palavras vazias não substituem ações reais. Falar de um "cessar-fogo sustentável" enquanto se arma Israel ou falar de "promoção da democracia" enquanto se apoia governos anti-democráticos define agora a hipocrisia da classe política do Norte Global.»

É evidente para a maioria das pessoas no mundo que foi o Norte Global que não conseguiu resolver as crises no mundo, quer se trate da crise climática ou das consequências da Terceira Grande Depressão. O Norte Global tentou substituir a realidade por uma linguagem eufemística, utilizando termos como «promoção da democracia», «desenvolvimento sustentável», «pausa humanitária» e – do ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido, Lord David Cameron, e da ministra dos Negócios Estrangeiros da Alemanha, Annalena Baerbock – a ridícula formulação de um «cessar-fogo sustentável»

Palavras vazias não substituem ações reais. Falar de um «cessar-fogo sustentável» enquanto se arma Israel ou falar de «promoção da democracia» enquanto se apoia governos anti-democráticos define agora a hipocrisia da classe política do Norte Global.

Os israelitas dizem que continuarão essa guerra genocida durante o tempo que for necessário. A cada dia que passa desta guerra, a legitimidade de Israel deteriora-se. Mas por trás dessa violência há o fim muito mais profundo de manter a legitimidade do projeto da NATO, cuja hipocrisia ecoa como a de pregos sendo arrastados contra um ensanguentado quadro negro.


Artigo republicado no âmbito de uma parceria com a Globetrotter, editado e adaptado para português de Portugal pelo AbrilAbril. O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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