ABIC: há uma «grande unanimidade» contra estas taxas «injustas e injustificáveis»

AbrilAbril acompanhou a manifestação de mais de 50 doutorandos contra as taxas de entrega das teses na Universidade de Lisboa, na qual foi entregue uma petição com mais de 1500 assinaturas. Agendada reunião com a reitoria.

Cerca de 50 doutorandos, bolseiros e investigadores participaram numa manifestação em frente à Reitoria da Universidade de Lisboa para entregar mais de 1500 assinaturas contra as taxas de entrega da tese. 30 de Abril de 2025 
Créditos / AbrilAbril

A recolha de 1570 assinaturas pelo fim do pagamento das taxas de entrega das teses de Doutoramento na Universidade de Lisboa foi, em vários sentidos, um trabalho de sapa da Associação dos Bolseiros de Investigação Científica (ABIC). Para as reunir, numa realidade com grande dispersão, sem espaços fixos de trabalho, em instituições distintas, «muitas pessoas tiveram de ir falar com os seus colegas, organizaram-se em grupos para ir bater às portas, para recolher assinaturas», afirmou Vasco Braz, dirigente da ABIC e doutorando na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), perante mais de 50 colegas presentes na manifestação realizada no dia 30 de Abril.

«Muitas vezes, quando iam bater às portas, recolhiam também mais pessoas para ir bater a outras portas, talvez até recolher ainda mais pessoas para ir a outras portas, recolher mais assinaturas, recolher mais pessoas». Para alcançar este resultado (1570 assinaturas, mais de 800 das quais de doutorandos) foi fundamental o «envolvimento» de muitos destes doutorandos e bolseiros, previamente isolados uns dos outros.

As taxas de entrega das teses de doutoramento na Universidade de Lisboa foram introduzidas (como em muitas outras instituições) para compensar os custos da apresentação das dissertações, como a impressão em papel e a deslocação de professores convidados. «Nós nunca estaríamos de acordo com essa justificação, explicou Sofia Lisboa, presidente da ABIC, ao AbrilAbril, mas «hoje em dia isso já nem sequer se coloca»: a maior parte das defesas são por zoom [à distância], os convidados não se deslocam, é um elemento que não tem qualquer acréscimo de custos para a Universidade».

Quando falamos em doutorandos, estamos a falar, em vários aspectos, «de trabalhadores que produzem durante 4 anos, que publicam artigos científicos, que organizam exposições, conferências, em alguns casos contribuem para o funcionamento dos laboratórios» das universidades. Como é possível, nestes termos, pensar sequer em imputar a estas pessoas, a quem é ainda exigido o pagamento de milhares de euros em propinas, o saldar de custos no final do processo de obtenção deste grau académico.

Questionada sobre a percepção de injustiça sobre esta taxa entre os doutorandos, a presidente da ABIC diz sentir uma grande unanimidade nesta reivindicação. «Até pode ser ridículo estarmos aqui a falar deste valor [que oscila entre os 250 e os 750 euros, dependendo arbitrariamente da faculdade] mas não é pelo apenas pelo custo», o simbolismo desta questão abre as portas de uma outra, e mais profunda, discussão: os doutorandos e bolseiros são, na prática, trabalhadores que não são reconhecidos na sua condição.

E é nessa questão que se perde a maior parte do rendimento, explica Sofia Lisboa. «Nós estamos a trabalhar durante 4 anos, não temos subsídio de férias, de Natal, subsídio de alimentação, não temos direitos de parentalidade totalmente assegurados como é o caso dos bolseiros que estão integrados em projectos», um vasto leque de aspectos directamente relacionados com o facto de não serem «considerados legalmente trabalhadores».

A ABIC recorre aos exemplos do Instituto Superior Técnico (IST) e da Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de Lisboa (FMH-UL). No IST [que só recentemente baixou o custo da taxa dos 500 para os 250 euros], 142 pessoas entregaram as suas teses no ano lectivo de 2023/24, o que significa que a instituição recebeu cerca de 71 mil euros através da taxa. Esse valor, de elevado custo para a grande maioria dos doutorandos, representa apenas 0.15% das fontes próprias do Técnico e 0.06% do Orçamento total do IST.

Na FMH-UL, foram realizadas 53 defesas de tese de doutoramento (média de 8.8 ano) entre 2018 e 2023, o que corresponde a 4858,33 euros anuais de receita proveniente da taxa (a 550 euros cada). Aplicando essa média às receitas próprias da instituição no Orçamento da FMH-UL para 2025 (16 381 330 euros), as taxas de entrega de tese não chegam a representar 0,3% do total, uma valor completamente resídual.

É, fundamentalmente, «uma questão de princípio». Os valores não são, em nenhuma das faculdades da Universidade de Lisboa, significativos. E se há uma necessidade de compensar, «que se façam as contas e que se compreenda como é que se pode colmatar essa necessidade, nomeadamente exigindo mais financiamento do Orçamento do Estado», defendeu Sofia Lisboa, relembrando que essa já tinha sido uma promessa, não cumprida, dos ministros Manuel Heitor e Elvira Fortunato, do PS.

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