Os cinco maiores bancos (CGD, BPI, Santander Portugal, Novo Banco e BCP) obtiveram lucros de 1,3 mil milhões de euros, só no primeiro semestre deste ano, um crescimento de cerca de 80% em relação ao ano passado.
Entretanto, apenas sete das multinacionais do petróleo anunciaram os seus resultados, que ascendem a 117,8 mil milhões de euros e correspondem a um aumento de 153%.
Este elevado crescimento das taxas de lucro, fruto do aproveitamento especulativo que os grupos económicos estão a fazer da guerra e das sanções, contrasta, por um lado, com as dificuldades da generalidade das micro, pequenas e médias empresas. Por outro, com o agravamento das condições de vida dos trabalhadores e das populações, vítimas da inflação e do aumento de bens essenciais, nomeadamente a energia e a alimentação.
Os lucros da Galp, 420 milhões de euros neste primeiro semestre, são grandes e chocantes, sobretudo quando confrontados com os brutais aumentos de preços dos combustíveis que martirizam a população. Entretanto, os neoliberais, por um lado, vão procurando justificar estes aumentos de preços com o aumento dos impostos (que até têm baixado) ou a guerra, como se a subida do preço dos combustíveis tivesse começado a 24 de Fevereiro. Por outro, a propósito dos lucros, tentam esconder a realidade falando dos prejuízos que a Galp teve durante os anos da pandemia, sem recorrer aos apoios do Estado, numa altura em que o preço do petróleo chegou a andar negativo, na lógica de que o lucro é a recompensa justa. Justificações que merecem duas considerações. A primeira é que, sendo verdade que na especulação bolsista daqueles tempos o petróleo chegou a andar por valores negativos, tal nunca teve grande reflexo no preço da gasolina ou do gásoleo contribuindo para aumentar os lucros na distribuição e comercialização. A segunda, para dizer que, segundo as próprias contas da Galp, o único ano em que a empresa deu prejuízo foi 2020 e tal deveu-se não apenas às consequências da pandemia, mas principalmente à decisão de encerrar a Refinaria de Matosinhos, que implicou colocar nas contas de 2020 prejuízos, nomeadamente os 153 milhões de euros de perdas por imparidade nos activos da refinação e as provisões de 128 milhões de euros para desmantelamento, desactivação, descontaminação e reestruturação. Isto é, não fora a decisão de encerrar a Refinaria de Matosinhos, penalizando a economia nacional, a Galp até em 2020, mesmo com a pandemia e o confinamento, teria dado lucro, algo como 84 milhões de euros. Aliás, a Galp comportou-se com os seus accionistas como se tivesse dado lucro, distribuindo dividendos (318 milhões de euros) sobre os resultados de 2020. Quanto ao argumento, também usado, de que com a «instabilidade» do sector «a Galp tem direito aos seus lucros porque, em alturas de prejuízo, também arcou com as consequências das perdas», basta olhar para o total de lucros destes dez anos, que são cerca de cinco mil milhões de euros, mesmo faltando seis meses de 2022. E há quem caracterize a situação como sendo a Galp «a seguir as regras do mercado que umas vezes lhe dão muito dinheiro e outras lhe criam muitas dificuldades». Porventura, o que queriam dizer é que umas vezes lhe dão muito dinheiro e noutras ainda mais dinheiro. Olhando para os accionistas da Galp, o maior deles é a Amorim Energia, que detém 33,34%, embora ela própria seja detida em 45% pelo Estado angolano e em 55% por duas holdings controladas pela família Amorim (mas não obrigatoriamente a 100%). A família Amorim controla a Galp com menos de 18,3% do seu capital, enquanto a Amorim Energia paga os seus impostos, «patrioticamente», na Holanda. O Estado, através da Parpública, detém 7,48% da Galp, mas recusa-se a ter qualquer papel enquanto accionista, excepto o de receber dividendos. Quanto ao restante capital, o essencial é detido por investidores institucionais (mais de 85%), sendo a sua distribuição geográfica muito elucidativa: EUA – 31,4%; Reino Unido – 26,80%; Resto da Europa – 15,9% e Portugal – 0,30%. «E há quem caracterize a situação como sendo a Galp «a seguir as regras do mercado que umas vezes lhe dão muito dinheiro e outras lhe criam muitas dificuldades». Porventura, o que queriam dizer é que umas vezes lhe dão muito dinheiro e noutras ainda mais dinheiro.» Como se pode ver, se é verdade que há todas as razões para os accionistas se alegrarem, essa alegria pouco chega a Portugal e aos portugueses. O que as contas do primeiro semestre deste ano também demonstram é que a Galp, através do aumento brutal do preço de venda, consegue aumentar os lucros apesar de não aumentar a produção: a produção de petróleo e gás diminuiu ligeiramente de 2021 para 2022 (de 111,8 para 111,2 Kbpd no petróleo e de 13,3 para 12,7 Kboepd no gás). Na refinação, a produção aumentou ligeiramente (de 40,7 para 44,7 mboe), mas os resultados líquidos dispararam de 45 para 285 milhões de euros. Mesmo nas energias renováveis, a variação do Ebitda (lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortizações) RCA, mesmo sendo muito pouco significativa, de -8 para -5 milhões de euros, fica a dever-se no essencial ao aumento do preço da electricidade vendida, que passou de 61,6 para 166,5 euros/Mwh. Em qualquer destes casos, o que fica completamente à vista é que o aumento de lucro da Galp se deve, antes de mais, à especulação com os preços. Estes lucros demonstram ainda duas coisas: – os interesses dos accionistas da GALP e o interesse nacional estão muito longe de ser a mesma coisa. Que o país tenha de importar o que antes produzia e exportava pouco ou nada interessa à Galp... desde que os seus lucros cresçam. Isto é, se os lucros podem crescer aumentando o preço em vez de aumentar a produção, para a Galp é igual. Para o País é que não. – o crime compensa. Observando os resultados dos primeiros semestres dos últimos sete anos, percebe-se perfeitamente a quebra de produção provocada, primeiro, pela pandemia e, depois, pelo encerramento da Refinaria de Matosinhos, a partir de 2020. Vê-se como os resultados baixaram durante a pandemia e como, devido à quebra na procura mundial, as margens de refinação baixaram significativamente. E vê-se também, para além de o ano de 2022 estar a ser marcado pelo aumento totalmente especulativo das margens de refinação, como foi errado encerrar uma refinaria que poderia estar neste momento a acrescentar uns cem milhões de euros aos resultados da empresa. Sobretudo, poderia permitir obter resultados positivos sem estas margens completamente especulativas Por fim, sublinhando que aqueles que estão a ganhar centenas de milhões com a liberalização querem aproveitar as consequências desastrosas dessa liberalização para ganhar ainda mais dinheiro, deixando de pagar impostos. Os impostos sobre os combustíveis baixaram significativamente no último ano, mas o preço dos combustíveis subiu beneficiando os lucros das petrolíferas. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Editorial|
Os obscenos lucros da Galp
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Os grupos económicos, embora não consigam esconder os avultados lucros e o seu crescimento, procuram esconder as suas causas: aumento da exploração e da especulação. Aliás, a afirmação recente de um dos principais banqueiros sobre a «hostilidade cultural ao capital e à sua acumulação» ou a acusação de populismo aos que denunciam estes lucros escandalosos, tem apenas como objectivo esconder que, por detrás estes lucros de uma minoria de privilegiados, estão também os baixos salários e os aumentos especulativos.
A ONU já veio reconhecer a necessidade de um imposto extraordinário sobre os lucros que estão a ser obtidos com a especulação. Mas não chega. É preciso aumentar salários, nomeadamente o salário mínimo, pôr fim aos mecanismos especulativos de fixação de preços, travar a liberalização da economia portuguesa e recuperar o controlo público de sectores estratégicos.
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