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|constituição

Direito de manifestação - extensão e limites 

Uma manifestação contra o Islamismo, realizada em Portugal, não só viola o artigo 41.º.1 da Constituição da República como é ainda um meio que conduz e fomenta o ódio racista e xenófobo (artigo 46.º.4). 

Créditos / lisboa.pt

Quando, sobre um mesmo tema, surgem duas ou mais opiniões divergentes, este torna-se controverso.                                                                                             

Pode um Presidente de Câmara (PdC), ao abrigo do artigo 2.º1. do Decreto-Lei (DL) 406/74 de 29 de Agosto (na redação dada pela Lei Orgânica n.º 1/2011 de 30 de Nov.), proibir uma manifestação? Com efeito, o PdC de Lisboa, baseado num parecer da PSP em como uma manifestação convocada pelo grupo 1143 contra a «Islamização da Europa» para o dia 3 de fevereiro, a partir da Praça Martim Moniz, acarretaria elevados e efetivos riscos para a segurança, a ordem e tranquilidade públicas (…) não havendo condições para assegurar a realização do desfile nos moldes comunicados, proibiu essa manifestação. Não satisfeitos com a decisão, os seus promotores recorreram para o Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, tendo esta instância, baseada, no essencial, na motivação subscrita pelo PdC, indeferido a medida cautelar requerida, «(…) desde logo, porque é realizada, precisamente, no local onde existe, com elevada probabilidade, a maior concentração de pessoas praticantes da religião islâmica em Lisboa (…)».  Este entendimento permitiu que a manifestação mudasse o local e o percurso para o Largo de Camões até ao Largo do Município de Lisboa.            

Em jeito de uma apreciação contextualizada convém ter presente que, na atualidade, um PdC é constitucionalmente uma entidade distinta da figura do que era o governador civil ou o PdC no antes do 25 de Abril, já que estes estavam diretamente dependentes do governo. Hoje, a legitimidade interventiva do PdC deriva enquanto órgão do poder local, e não do Governo. Enquanto o governador civil podia determinar diretamente a intervenção das forças de segurança, já o PdC, na atualidade, tem de solicitar esta intervenção à força de segurança competente. Foi o que o PdC fez ao solicitar um parecer da PSP.

Juridicamente, o DL 406/74 tem de se enquadrar e ser interpretado em conformidade com a filosofia e os valores democraticamente assumidos pela Constituição da República Portuguesa (CRP). Nos termos do artigo 18.º deste diploma, os direitos, liberdades e garantias podem ser restringidos, mas não proibidos. Desta feita, a todos os cidadãos é reconhecido o direito de manifestação (art. 45.2. da CRP). Em princípio, nenhuma manifestação pode ser proibida. Neste domínio, a conclusão 9.ª do Parecer do Conselho Consultivo da PGR n.º 1/2021 de 10.09.202 dispõe que, face ao aviso de realização de uma manifestação, o PdC pode opor objeções ao plano dos promotores em razão da ilicitude ou dos meios que pretendem utilizar.

«A "proibição" determinada pelo PdC mais se configura a figura constitucional do "não consentimento" (efeito prático do qual coincide com o da proibição), devendo, no entanto, expressar com clareza e sem subterfúgio que a mesma se fundava na violação da CRP e não se escudar em explicações aleatórias como fez alegando o "perigo de ordem pública".»

Assim, por exemplo: uma manifestação visando a violação da vida ou a integridade física ou moral da pessoa não pode ser consentida (artigos 24.º e 25.º da CRP), não sendo necessário fazer apelo ao normativo congénere do Código Penal (artigo  131.º) pois se o fizesse jurisdicionaria a questão; tão pouco se tornaria necessário formular qualquer pedido de parecer à uma força de segurança. De igual forma, não podem ser consentidas manifestações de cariz racista ou fascista por tal violar o 46.º.4 da CRP. No caso em apreço, acresce que o não consentimento do PdC poderia fundamentar-se na violação ao art. 13.º. 2 (ninguém pode ser prejudicado em razão de origem ou religião), e do artigo 41.º (liberdade de religião) ambos da CRP. Tudo isto para dizer que o fundamento para a não realização da manifestação poderia e deveria ser esgotado com exclusiva referência aos preceitos da CRP. Os normativos constitucionais impõem-se por si próprios em sede administrativa.

Na verdade, uma manifestação (ato de efeito imediato e instantâneo) contra o Islamismo realizada em Portugal não só viola o artigo 41.º.1 da CRP – A LIBERDADE DE RELIGIÃO É INVIOLÁVEL – como é ainda um meio que conduz e fomenta o ódio racista e xenófobo – artigo 46.º.4. Como tal, não pode nem deve ser consentida. 

Em sentido contrário a este entendimento, é apresentado o argumento de que o preceito constitucional – art.46º.4. ao «não consentir organizações  racistas» não alude à forma, mas apenas ao conteúdo da ação em causa. Em comentário e salvo o devido respeito, e ressalvada a ingenuidade argumentativa, olvida-se nesse entendimento que é pela forma que o conteúdo se manifesta ou se revela. 

A generalidade dos meios de comunicação social, referindo-se ao caso, em vez de sublinhar a flagrante violação da CRP que a manifestação materializava, priorizaram o aspeto político em como a mesma incidia na proibição de uma manifestação da extrema-direita. Conquanto esta informação corresponda à verdade, urge sublinhar que a proibição não pode assentar neste facto por se tratar de um posicionamento que está vedado ao PdC assumir. 

Aqui chegados entende-se que a «proibição» determinada pelo PdC mais se configura a figura constitucional do «não consentimento» (efeito prático do qual coincide com o da proibição), devendo, no entanto, expressar com clareza e sem subterfúgio que a mesma se fundava na violação da CRP e não se escudar em explicações aleatórias como fez alegando o «perigo de ordem pública». Independentemente desta motivação não ser válida para não consentir uma manifestação, dada a margem de arbitrariedade e latitude que implica para não consentir manifestações em geral, a verdade é que o «perigo para a ordem e tranquilidade pública» é um caso de polícia só visível e combatível à posteriori,  para o qual a força de segurança tem de estar preparada com antecedência.  


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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