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A melhor política é um bom negócio

Trump é um político sui generis pela imprevisibilidade que o faz saltar fora dos circuitos mais formatados da política tradicional. Tem os truques dos populistas com todo o fogo de artifício anti-sistema, quando estão bem incrustados num sistema que consolida o neoliberalismo.

Donald Trump
Donald TrumpCréditosMichael Reynolds / EPA

As últimas e incendiárias declarações de Trump, quando diz que até aconselharia a Rússia a invadir ou fazer «o que raio quisesse» aos aliados que não gastassem 2% em defesa, colocaram em polvorosa dirigentes e comentadores políticos europeus. Por cá, a cacofonia dos nossos dirigentes e comentadores políticos acertou o passo com eles. Os democratas norte-americanos acusam-no de ser o mais anti-americano dos presidentes e candidatos a presidentes dos EUA, de se vergar aos interesses do Kremlin. Faltou muito pouco para o acusarem de ter desistido do excepcionalismo norte-americano que o fez, nos últimos séculos, promover por todo o mundo guerras, golpes de estado, revoluções coloridas, a panóplia imperialista que desde a sua fundação pôs em marcha o que mais se acentuou quando, depois da II Grande Guerra Mundial, beneficiou largamente do desfazer dos impérios coloniais europeus.

De facto, Donald Trump engrossou a voz num comício na Carolina do Sul, dizendo que iria «encorajar a Rússia a atacar qualquer nação da NATO que não cumprisse o objetivo de gastar 2% do Produto Interno Bruto (PIB) na defesa. Está a apontar para 19 dos 31 países que integram a NATO sem cumprirem esse rácio. Garante a esses países que «não, não vos protegeria. Na verdade, encorajá-los-ia (a Rússia) a fazer o que lhes apetecer. Têm de pagar. Têm de pagar as vossas contas». Acreditará Trump que a Rússia ficou estimulada a invadir esses países? Isso quererá dizer que Trump é um aliado secreto de Putin, como rapidamente circulou nos media e nas redes sociais da propaganda imperialista? As primeiras reacções russas foram  ouvir essas declarações sem surpresa, com indiferença de quem está habituado a assistir a encenações desse jaez.

Há que lembrar que, quando foi pela primeira vez candidato e depois eleito presidente, Trump tinha feito idêntico pronunciamento logo criticado duramente por Jens Stoltenberg, secretário-geral da NATO, que pós-eleições foi dos primeiros a ir ao beija-mão na Casa Branca. Espera-se que a cena se repita se os dois reocuparem os cargos que na altura exerciam.

Trump é um político sui generis pela imprevisibilidade que o faz saltar fora dos circuitos mais formatados da política tradicional. Tem os truques dos populistas com todo o fogo de artifício anti-sistema quando estão bem incrustados num sistema que consolida o neoliberalismo, beneficiando os ricos cada vez mais ricos. É um negociante parafascista agarrado à máquina de calcular dos negócios. Quando faz esses bombásticos anúncios espera cobrar dividendos tanto interna como externamente, explorando o estado de sítio que se vive e a bem visível ebulição geoestratégica.

O auge da propaganda nos areópagos europeus é papaguear uma suposta convergência Trump-Putin esquecendo-se, ou melhor, fingindo cinicamente esquecer-se que foi Trump quem rasgou os tratados entre os EUA e a União Soviética que limitavam a proliferação das armas nucleares, dos mísseis balísticos, do controlo de armamentos, atirou para o lixo os acordos com o Irão que limitavam a sua capacidade nuclear, promoveu os chamados acordos de Abraão que consolidavam a posição de Israel no Médio Oriente, mais pôs em práticas comerciais contra a China e que, como o faz novamente hoje, chantageou com algum êxito os seus aliados da NATO para que gastassem 2% do PIB em defesa, o que reduzia os investimentos norte-americanos com a aliança.

«Trump é um político sui generis pela imprevisibilidade que o faz saltar fora dos circuitos mais formatados da política tradicional. Tem os truques dos populistas com todo o fogo de artifício anti-sistema quando estão bem incrustados num sistema que consolida o neoliberalismo, beneficiando os ricos cada vez mais ricos.»

O que Trump pretendia, e de algum modo conseguiu, foi na política externa novamente ameaçar a Federação Russa e países que lhe são próximos, compelindo-os a aumentarem despesas com o armamento, internamente redirigindo as poupanças com as contribuições para a NATO para investimentos direccionados para o complexo militar-industrial-tecnológico norte-americano. Espera que esse influentíssimo conglomerado o prefira aos democratas. Sabe, até bem demais, que essa gente vai dando suporte tanto a democratas como republicanos, mudando de canto nos combates de wrestling que estes encenam, apoiando conforme as circunstâncias uns ou outros em função dos prometidos sucessos económicos. Cotejem-se as contribuições para as campanhas eleitorais nos últimos decénios e a coincidência entre os eleitos e o volume desses aportes monetários. 

Esses incendiários pregões dirigem-se mais para o interior dos EUA que para o exterior, pouco se preocupando com o efeito do seu ribombar na Europa que se arrasta numa crise económica por cega vassalagem de que os principais beneficiários são os norte-americanos. Democratas e republicanos estão alinhados com os princípios de política externa definida pelos straussianos, sintetizados por Wolfowitz, que preconizam o enfraquecimento da União Europeia quando hipoteticamente se poderia perfilar como concorrente dos interesses dos EUA. Quer é ser ouvido, como o tinha feito anteriormente quando concorreu com Hillary Clinton, pela média e pequena burguesia, pelos negros e hispânicos cada vez mais empurrados para os limites de sobrevivência pelas políticas económicas dos democratas, políticas que Michael Hudson e Radhika Desai escalpelizam e classificam como de «apartheid económico» num bem documentado texto.  

Donald Trump, como bom populista, explora esse mal-estar generalizado da sociedade norte-americana aprontando-se para cavar um fosso ainda maior entre os super-ricos, os remediados e os pobres, acenando com medidas de incentivo ao investimento privado como ultraliberal que é, mascarando os seus propósitos. Joga com a falta de memória, a desinformação e a intoxicação da opinião pública, os grandes trunfos dos novos fascistas neoliberais e ultraliberais em todo o mundo.

Atente-se na Argentina de Millei, na Itália de Melloni, por cá na Iniciativa Liberal e no Chega, nas derivas de direita por toda a Europa que o seu amigo e conselheiro Steve Bannon tem oleado. O truque é acenar com uma redução dos gastos na NATO reorientando-nos para a economia interna, o que num país muito fechado sobre si próprio funciona perfeitamente, sobretudo quando Biden a tem afundado. 

«Joga com a falta de memória, a desinformação e a intoxicação da opinião pública, os grandes trunfos dos novos fascistas neoliberais e ultraliberais em todo o mundo.»

A NATO para Trump é tão instrumental como o tem sido desde a sua fundação para os EUA. A diferença é que quer extrair o máximo lucro com o menor investimento. Espalha o pânico numa frágil Europa esperando que além dos reclamados 2% de contribuições o alarme provocado na UE a levem a reforçar o denominado Mecanismo Europeu para a Paz, a armadura guerreira da União Europeia, com que muito está a lucrar o complexo-militar-tecnológico norte-americano. O mecanismo é simples, mesmo primário, os antigos países do Pacto de Varsóvia, actualmente membros da NATO, têm-se desfeito dos arsenais herdados da União Soviética enviando-os para a Ucrânia enquanto os modernizam adquirindo-os aos EUA, utilizando os dinheiros desse fundo. A Polónia é o melhor exemplo dessa engrenagem que está a desenhar na Europa um novo eixo Washington-Londres-Varsóvia que se aproveita dos desvalimentos da Alemanha e da França para se ir impondo, substituindo o de Berlim-Paris, que desde a fundação da UE era dominante.

Paralelamente, os EUA incentivando as sanções contra a Rússia aceleraram a crise económica na Europa tornando-a incapaz de se revitalizar, garroteando-a com os preços de energia que impôs, tornando-se o principal fornecedor em substituição dos muito mais baratos russos, praticando agressivas políticas proteccionistas de incentivo à produção e consumo internos que encurralam a Europa, desviando investimento directo estrangeiro, fazendo-a perder quotas de exportação para os EUA, debilitando a sua competitividade nos mercados internacionais, o que é bem visível, sobretudo, na Alemanha que era o seu motor, em que a deslocalização de empresas e a recessão técnica é uma realidade. 

Créditos

Trump o que anuncia é o agravamento dessa situação exigindo que os cada vez mais escassos recursos europeus sejam aplicados numa política de defesa que só beneficia os EUA. Simultaneamente, afirma que com ele a guerra na Ucrânia acaba em dois dias. Fá-lo bem ancorado nos seus princípios de caixeiro viajante da política que olha para o fim dessa guerra como um bom negócio para os EUA. Não é melhor nem pior que os democratas que farisaicamente afirmam altissonantemente que estão a defender a democracia e a liberdade, uma intrujice com que travestem as ferramentas do expansionismo norte-americano. Pragmaticamente Trump considera que mais aplicações de capital na Ucrânia deixaram de ser necessárias, devem começar a ser rentabilizadas, daí a sua urgência na paz. Sabe que a direcção, a orientação, a captação de fundos, nomeadamente europeus, para o grande negócio da sua reconstrução vai ser comandada por um conglomerado administrado pelo fundo abutre de investimentos Blackrock e pelo JP Morgan Chase que já o apresentaram em Londres aos investidores prometendo chorudos lucros.

Tudo está a correr maravilhosamente nos carris até porque a Blackrock é actualmente quem de facto controla e dirige as finanças ucranianas, todos os investimentos passam pelo seu crivo. Simultaneamente, a camarilha Zelensky introduziu uma alteração constitucional que permitiu que os férteis terrenos agrícolas que anteriormente só poderiam ser detidos por pessoas singulares ou colectivas aborígenes pudessem ser propriedade de estrangeiros. A resultante é que hoje mais de 65% desses terrenos são propriedade de multinacionais como a Bayer/Monsanto e Cargill que estão prontas para abocanhar mais uns milhares de hectares. Os oligarcas norte-americanos esfregam as mãos com essas perspectivas de mui frutuosos negócios, ainda para mais agilizados pela corrupção que cavalga à rédea solta por aquelas paragens. 

As políticas preconizadas por Trump têm esses objectivos no horizonte. Nenhum princípio o trava, aliás não tem princípios, tudo para ele é um negócio. O Make American Great é uma barganha que, no interior dos EUA, aprofunda as diferenças entre os ricos e a restante população, no plano internacional coloca os aliados a reboque, enfraquecendo-os e tornando-os mais dependentes dos interesses norte-americanos, imaginando que os torna mais robustos e capazes de enfrentar a concorrência dos países mais desenvolvidos e em crescimento que se abrigam nos BRICS. Os ventos da história não correm a seu favor, excepto no rufar dos tambores da demagogia pelos estados da união que parecem estar a ecoar mais fortes que o dos democratas. O grande dilema do povo norte-americano, não é de agora, é o de escolher entre dois males, escolher o mal menor. 

«O Make American Great é uma barganha que, no interior dos EUA aprofunda as diferenças entre os ricos e a restante população, no plano internacional coloca os aliados a reboque, enfraquecendo-os e tornando-os mais dependentes dos interesses norte-americanos (...).»

A diferença entre Trump e os seus concorrentes é ser mais imprevisível a gerir as sobras norte-americanas e a ratear as sobras europeias, o que resta dos imperialismos e colonialismos em decadência.

Nós, por cá, tudo mal enquanto o jardim do Borrell for o pântano em que nos vamos afundando sem qualquer expectação.

Faz parte da propaganda uma quase aliança entre Trump e Putin, o que é difundido pelos falcões e neo-cons democratas, atirando para o limbo da memória que foi Trump quem rasgou os acordos entre a União Soviética e os EUA, a que a Federação Russa tinha dado continuidade, sobre armas nucleares, mísseis balísticos nucleares e convencionais, sobre limitações de armamento que acabaram por dar novo impulso ao complexo militar-industrial-tecnológico dos EUA que vai dando suporte tanto a democratas como republicanos que disputam o poder em combates de wrestling muito bem encenados, embora variáveis em função dos sucessos económicos. Não esquecer que não foi Trump mas Clinton e depois Obama que puseram fim às leis anti-monopolistas da lei Glass-Seagall, escancarando as portas para a actual financeirização da economia norte-americana que vai à vez apoiando democratas ou republicanos.

«Faz parte da propaganda uma quase aliança entre Trump e Putin, o que é difundido pelos falcões e neo-cons democratas, atirando para o limbo da memória que foi Trump quem rasgou os acordos entre a União Soviética e os EUA, a que a Federação Russa tinha dado continuidade (...).»

O que a foto e os comentários esquecem é que são poucas as diferenças entre um Steve Bannon e uma Victória «que se foda a Europa» Nuland, ambos pondo em prática de forma diversa as políticas dos neo-cons straussianos bem ilustradas nas teorias de Wolfowitz. Houve de facto um reduzir da actividade de golpes de estado, bombardeamentos a outros países, revoluções coloridas durante o período de Trump o que se deveu unicamente a outras prioridades económicas. Isso é aproveitado pela desvairada propaganda dos falcões democratas para inventar uma suposta aliança entre Putin e Trump e para dar um novo furor ao complexo militar-industrial e tecnológico, sobretudo com a guerra na Ucrânia que estamos todos a pagar.

A idiotia generalizada nem sequer percebe que o chamado fundo para o Mecanismo Europeu para a Paz o financia, porque enquanto países como a Polónia envia armas do tempo do Pacto de Varsóvia para a Ucrânia compra novas armas aos EUA. Na realidade Biden, Trump, Putin trabalham e são apoiados pelas suas oligarquias locais o que provoca as variáveis políticas de todos conhecida Os comentários emitidos são de uma enorme ignorância, só possível pela intoxicação promovida pela comunicação social mercenária, não sabendo distinguir a ponta do icebergue do muito que está oculto. Mas esse é o estado de sítio que vivemos.

Lamentavelmente, muita gente bem intencionada não consegue ultrapassar o nevoeiro das balelas da comunicação social mercenária que tem até o aspecto curioso de jornais norte-americanos, que são caixas de ressonância da Casa Branca, Pentágono, CIA, NSA, FED, sistema económico-financeiro darem notícias mais críticas da realidade que se vive do que os da caduca Europa. 

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