Numa entrevista de John Pilger a Julian Assange, recentemente divulgada, o editor da WikiLeaks defende que a Donald Trump, candidato pelo Partido Republicano à presidência dos Estados Unidos da América nas eleições que hoje se celebram, não seria permitido vencer. Porquê? Porque o establishment não está com ele. Entenda-se: Clinton é a candidata de Wall Street, das empresas de armamento, da CIA, apoiada por sauditas e qataris, e pelos grandes meios de comunicação social. E nota-se.
Com um currículo impressionante na carteira – Iraque, Honduras, Líbia, Ucrânia, Síria têm a sua marca –, a candidata pelo Partido Democrata não deixa os créditos por mãos alheias e já prometeu mais do mesmo para os tempos que se avizinham. No entanto, a máquina de propaganda mediática suavizou a sua imagem – bastou prestar alguma atenção ao guião dos telejornais de cá para ver o «falcão» transformado em mulher sorridente, numa figura mais sensata e simpática que um Trump histriónico, tempestuoso, brutamontes, racista.
A campanha fica marcada por debates que desceram ao insulto e a observações sobre a vida privada, um nível próprio para entreter as audiências dos canais televisivos propagadores da mediocridade, o nível do circo e do show, da imagem e do espectáculo, em que a política se afasta dos debates centrais à sociedade e mantém os cidadãos norte-americanos afastados das questões estruturais que os afectam, das suas lutas diárias. Não é de estranhar, por isso, que uma elevada percentagem de norte-americanos – 60%, de acordo com a empresa Gallup – encare Trump como o pior candidato à presidência do país nos últimos 25 anos e que Hillary Clinton seja a segunda nessa lista.
Por incrível que pareça, há mais candidatos à presidência nestas eleições. Dependendo dos estados, os eleitores registados podem votar em mais sete candidatos para além de Trump e Clinton. No entanto, a «invisibilização» destes candidatos outros pela comunicação social leva a que seja difícil furar o monopólio do bipartidismo montado para bem da estabilidade da nação. Mesmo quando logram furar a barreira – num contexto em que é cada vez mais sensível a insatisfação de vastas camadas da sociedade com o sistema da «democracia capitalista» à americana –, esses candidatos têm de combater a forte tendência para a abstenção do eleitorado e outra ainda, que é a do voto «útil», a do voto pelo «menos mau» dos dois que, no fundo, sabem estar na contenda...
E, depois, também há quem acredite na cantiga que lhe chega aos ouvidos: o Partido Democrata é, por contraste com o Republicano, uma força de esquerda, que vela pelos interesses das camadas mais desfavorecidas ou, se não chega a tanto a música, que defende os interesses dos cidadãos, por oposição a republicanos assumidamente de direita. A experiência encarregou-se bastas vezes de demonstrar que não é assim.
E o que é válido para aqui também o é para a política externa. Depois do mandato de Obama, restam poucos argumentos aos defensores das diferenças. Vença quem vencer, o de uma banda ou o da outra ir-se-á ajeitar ao lugar preparado. E nada faz prever que, terminado o big show, que até mete cançonetistas de verdade, a política norte-americana de ingerência, agressão e saque se vá coser com outras linhas.
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