Contradições

O referendo de ontem, na Hungria, é mais um sinal de que o crescimento da extrema-direita na Europa segue a par da retirada de parcelas da soberania nacional.

Migrantes atravessam a barreira de arame farpado na fronteira entre a Hungria e a Sérvia a 25 de Agosto de 2015
CréditosGémes Sándor / CC BY-SA 3.0

O voto esmagador pelo «não» no referendo de ontem, na Hungria, revela uma esmagadora rejeição da imposição de quotas de realojamento de refugiados pela União Europeia (UE). O resultado era esperado e, apesar de a participação ter ficado aquém dos 50% que o tornava vinculativo, a rejeição à pergunta sobre a política comunitária para o realojamento de refugiados e migrantes foi esmagador – 98,33% dos 3,5 milhões de húngaros que foram às urnas.

Através do referendo, os húngaros eram questionados sobre a aceitação de quotas para alocação de migrantes pelos 28 países da UE decididas em Bruxelas, sem que Assembleia Nacional da Hungria participe na decisão. Uma pergunta que suscita preocupações com a perda de soberania, mas também tensões e derivas xenófobas e racistas.

A votação massiva pelo «não», ainda que tenham participado menos de metade dos eleitores húngaros, deixa o governo numa posição que lhe permite reclamar a vitória. A posição dos principais partidos húngaros, pelo «não» ou apelando a um boicote, revela quão complexa é a situação política na Hungria e talvez ajude a explicar o crescimento do partido de extrema-direita Jobbik e a crescente retórica xenófoba e racista, muitas vezes acompanhada de acções concretas, pelo Fidesz, partido do primeiro-ministro Viktor Orbán.

«A verdade é que a responsabilidade pela situação de milhões de pessoas em África e no Médio Oriente cabe, em grande medida, a vários países da UE »

A verdade é que a responsabilidade pela situação de milhões de pessoas em África e no Médio Oriente cabe, em grande medida, a vários países da UE que contribuíram para a desestabilização de países como a Síria, ou mesmo para a destruição de estados, como na Líbia. O plano europeu, através do qual se despeja dinheiro sobre a Turquia para servir de tampão, para depois se distribuir pelos estados-membro os migrantes e refugiados que entram a conta-gotas, é particularmente revelador da hipocrisia de Bruxelas.

Se por um lado não são assumidas as responsabilidades devidas por parte do directório europeu nos conflitos que provocaram deslocações massivas de refugiados e migrantes, a aposta parece ser num renovado ataque à soberania nacional, através da imposição de quotas à revelia das instituições dos estados-membro.

Os últimos anos têm mostrado, como no referendo de ontem, que este é caminho fértil ao crescimento da extrema-direita, do fascismo, da xenofobia, do racismo. Sabemos também que estes são caminhos que só conduzem à intensificação da exploração, e que servem os interesses dos mais poderosos e a União Europeia tem grandes responsabilidades no crescimento da extrema-direita pela Europa.

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