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Vacinação assenta na precariedade dos enfermeiros

Em vez de ser o SNS a dar resposta à vacinação contra a Covid-19, as autarquias e ARS têm recorrido a contratos precários, em alguns casos através de empresas de trabalho temporário.

CréditosPaula Borba / Câmara Municipal de Setúbal

A crescente necessidade de enfermeiros para trabalhar nos vários centros de vacinação distribuídos pelo País levou as câmaras municipais e as administrações regionais de saúde (ARS) a contratarem profissionais de enfermagem através de empresas externas, mas os valores pagos em regime de recibos verdes diferem significativamente consoante o concelho.

Em declarações ao AbrilAbril, Rui Marroni do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP/CGTP-IN) afirmou que esta situação vem demonstrar a justeza da reivindicação pela contratação de mais profissionais de saúde.

Depois de muitos meses sem respostas da parte do Governo, foi divulgado a 12 de Maio um despacho que prevê a contratação de 630 enfermeiros para os cuidados de saúde primários. Dos 4200 contratos previstos para 2021, metade seriam efectivados no primeiro semestre, mas ainda não houve contratações porque a regulamentação não está distribuída.

«Ainda vai demorar até que este processo se concretize, e até lá faltam enfermeiros e os contratados no âmbito da pandemia estão a ser despedidos», afirmou o dirigente, acrescentando que mesmo o número anunciado é insuficiente para as várias exigências que estão colocadas ao Serviço Nacional de Saúde (SNS).

No que toca à vacinação, a necessidade de profissionais «vai manter-se» porque «a pandemia não vai desaparecer», referiu Rui Marroni. Se, por um lado, o SNS devia ter ter «o número de enfermeiros suficientes» para responder às necessidades, por outro, as autarquias «estão a tentar resolver os problemas» mas recorrendo à contratação com vínculos precários e baixos salários.

«São salários miseráveis que não deviam ser sequer praticados», defendeu o dirigente, concluindo que a contratação nestes moldes não só não resolve o problema, como está a beneficiar as empresas intermediárias, que lucram com a urgência da situação que vivemos à custa da exploração e precarização destes profissionais.

«Não pode ser o poder local o responsável por isto. E aqui entramos na discussão da municipalização, que cria desigualdades no SNS, entre regiões com mais ou menos meios», alertou o sindicalista, acrescentando que a privatização destes serviços é uma ameaça real.

Contratados a vulso e pagos à hora

Ao contrário da remuneração de um enfermeiro com contrato, que está tabelada pela carreira especial de enfermagem, os profissionais contratados a recibos verdes pelas câmaras e ARS não têm uma tabela que regule o valor mínimo e máximo por hora de trabalho, o que gera grandes discrepâncias.

Segundo noticia o JN, um enfermeiro ao serviço do Município de Oeiras ou de Cascais ganha o dobro daqueles que estão ao serviço da Câmara de Vila Nova de Gaia, e o triplo do que aufere um contratado por uma empresa de trabalho temporário. Os 20 enfermeiros contratados pela Câmara de Cascais à empresa Blue Ocean Medical recebem 20 euros por hora a recibos verdes, o que dá 15 euros líquidos. É também este o valor pago aos 29 enfermeiros que o Município de Oeiras contratou através da mesma empresa. Contudo, os 52 contratados directamente por Gaia recebem metade disso.

Há quem recorra a empresas de trabalho temporário, como é o caso de Lisboa, que rubricou dois contratos com a Randstad, num total de 1,7 milhões de euros, para «aquisição de serviços de recrutamento de pessoal de enfermagem para a implementação do plano de vacinação». Ao JN, nem a Câmara de Lisboa nem a Randstad dizem quanto pagam aos enfermeiros.

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