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Mais de 37 migrantes mortos em Melilha ao tentarem entrar em Espanha

Imagens mostram expulsões à força de centenas de emigrantes que agonizavam no solo depois de uma queda de cerca de uma dezena de metros, numa vala em território espanhol.

Mais de dois mil migrantes tentaram entrar em território espanhol no enclave de Melilha
CréditosDR / DR

Na passada sexta-feira de manhã, cerca de duas mil pessoas tentaram saltar a cerca que rodeia o enclave espanhol de Melilha no meio do território de Marrocos. Mais de 500 conseguiram passar a barreira e atiraram-se para uma vala dentro de Espanha que dificulta o acesso à cidade espanhola. Cerca de 133, segundo a Guarda Civil, conseguiram chegar à cidade. O que aconteceu ao resto? O resto foi contido tanto pelas forças de segurança espanholas como pelas forças e corpo de segurança marroquinos, que os prenderam na vala, até os expulsarem.

Durante horas, centenas de imigrantes ilegais agonizaram feridos, numa vala em território espanhol, sem ter recebido qualquer auxílio das autoridades espanholas e sendo agredidos por polícias marroquinos que os expulsavam para território marroquino.

Mohamed passou 63 anos da sua vida em Nador e viu muitos tentarem saltar a vedação em frente da sua loja, mas nada como o que aconteceu com as duas mil pessoas que tentaram entrar na cidade espanhola adjacente. «Nunca vi tanta morte».

Segundo testemunhos, as vítimas foram esmagadas e sufocadas pela multidão depois de terem ficado presas numa fenda antes do arame farpado no lado marroquino, onde se formou um grande bloqueio humano entre as pessoas que ainda estavam a chegar e as que estavam a tentar passar o arame farpado e tinham caído para a vala.

A Associação Marroquina dos Direitos Humanos (AMDH)  divulgou um vídeo mostrando dezenas de pessoas deitadas no chão, empilhadas umas em cima das outras, algumas feridas, perto da cerca e vigiadas por polícias marroquinos.

A AMDH pediu que «o enterro rápido dos migrantes» que morreram não fosse realizado sem a abertura de uma «investigação global, rápida e séria para determinar responsabilidades». Várias ONGs alertaram para os atrasos nos cuidados de saúde prestados às pessoas feridas. «As vítimas da tragédia de Melilha agonizaram durante horas sob o olhar cruel daqueles que deveriam ajudá-las e não o fizeram», denunciou Helena Maleno, fundadora de uma das ONGs que ajudam os migrantes.

Pedro Sánchez elogia repressão

O Presidente do governo espanhol, Pedro Sánchez, pelo seu lado, defendeu as acções dos polícias marroquinos e espanhóis responsabilizando «as máfias que traficam seres humanos» pelo sucedido.

Fê-lo durante a conferência de imprensa que deu após o Conselho de Ministros extraordinário realizado este sábado, onde lhe perguntaram se se manteve firme nas suas declarações, assegurando que a polícia marroquina tinha estado «totalmente empenhada em tentar evitar o violento ataque» à cidade autónoma, mesmo depois de ter da morte de pelo menos 37 pessoas na tentativa de saltar a vedação.

«Ontem, exprimi pela primeira vez a minha solidariedade e reivindiquei o extraordinário trabalho realizado pelas forças e corpos do Estado no nosso país, alguns deles guardas civis que ficaram feridos em consequência da agressão violenta, e também quero repetir este qualificativo, violento e organizado pelas máfias que traficam seres humanos», salientou o líder «socialista».

Uma opinião pública sem empatia e um poder racista

Uma opinião que não tem a concordância de todos. No jornal espanhol de esquerda El Salto, mostra-se as razões que estão por detrás dos poderosos da Europa terem uma empatia tão selectiva em termos de vítimas.

«Dezenas de corpos humanos moribundos amontoados no chão. Não se trata de um filme. Se fosse um filme, pelo menos os espectadores deixariam correr algumas lágrimas, se fosse uma ficção bem escrita, com personagens desenvolvidas em profundidade, se tivéssemos visto na versão original legendada flashbacks das longas viagens daqueles corpos deitados sob o sol, do momento em que decidiram que, apesar de tudo, tinham de tentar, uma dor aguda correria através dos nossos corpos activando a nossa humanidade. As cenas em que abraçaram as suas mães pela última vez, largaram um beijo na cabeça de uma criança, seriam acompanhadas por uma banda sonora de piano, suave e emotiva, que lentamente se desvaneceria, à medida que víamos as personagens afastarem-se de casa, as suas costas curvadas pelo peso da responsabilidade de sustentar uma família.»

Não poupando o papel do suposto governo progressista de Espanha e o seu fotogénico líder, que tão facilmente fecha os olhos às mortes dos mais fracos.

«Mas não é um filme, não há espaço para empatia nas notícias, nem para sentimentos progressistas quando se tratam de homens negros. A banalidade do mal é também felicitar a imprensa pelo bom trabalho de colaboração entre as forças fronteiriças numa operação que já custou pelo menos 37 vidas. Ser um Eichmann que faz o seu trabalho, mesmo que seja você que presida a um governo. E a necropolítica é o verdadeiro governo, a lógica que subjaz a toda esta parafernália institucional e democrática que quer parecer limpa e livre de culpas, esquecendo os corpos espancados e as vidas perdidas. E assim, de repente, vê-se transformado num burocrata nazi, tornando possível a morte de outros com a eficiência e formalidade que lhe toca, assinando acordos que são penas de morte colectivas e sumárias.»

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