|São Pedro da Cova

A revolução dos mineiros de São Pedro da Cova, agora em livro 

Quando o povo ocupou o que era seu, assim se intitula a obra que vai ser apresentada este sábado sobre o movimento que, em 22 de Maio de 1975, ocupou os antigos escritórios das minas de carvão. 

Na noite de 22 de Maio de 1975, uma multidão de pessoas concentrou-se no largo dos escritórios ocupados 
CréditosAdriano Rangel / Museu Mineiro de São Pedro da Cova

A ideia de perpetuar esta história surgiu de uma exposição no Museu Mineiro de São Pedro da Cova sobre o Centro Revolucionário Mineiro (CRM), em 2015, era então presidente desta Junta de Freguesia o escritor e historiador Daniel Vieira, actual vereador na Câmara Municipal de Gondomar, e um dos autores do livro. 

O CRM resultou da ocupação dos escritórios da então Companhia das Minas pela população local, acto que se revelaria  um dos mais marcantes do pós-25 de Abril no Norte do País. A partir daí, ocupantes, associações de moradores e outras entidades reuniram-se com o propósito de melhorar a qualidade de vida desta comunidade mineira, nomeadamente em questões associadas à saúde e à habitação. 

«As condições de habitabilidade à época eram muito fracas, muito más, e uma das grandes medidas do CRM, tomada num grande plenário realizado logo após a ocupação, foi de os trabalhadores deixarem de pagar as rendas à Companhia das Minas, porque embora a exploração tenha encerrado, ela ainda se mantinha [como senhorio], e passarem a pagar a si próprios, no sentido de esse dinheiro vir a ser aplicado em obras de beneficiação das casas», conta ao AbrilAbril Micaela Santos, que é, juntamente com Ana Paula Correia, outra das autoras do livro.

Fac-símile do comunicado redigido em 23 de Maio de 1975, publicado no livro «Quando o povo ocupou o que era seu»    Créditos

Para além disso, o movimento pretendia que o património da Companhia passasse a ser da freguesia como forma de compensar a população local pelos 170 anos de exploração mineira, em que o povo, constata Micaela Santos, «pouco viu» de retorno, além de ter sofrido o impacto da inalação de grandes quantidades de sílica, acabando por contrair a doença.

«Houve um trabalho quanto às reformas por invalidez e velhice, que só foi possível através da recolha dos cadastros dos trabalhadores que ainda se encontravam nos escritórios ocupados, e a partir daí houve também um intenso trabalho para que as indemnizações fossem devidamente pagas aos trabalhadores», refere Micaela Santos.

A actividade do CRM passou igualmente pela intervenção nas áreas da Cultura, com teatro e cinema, e da Educação, com um programa de alfabetização de adultos. 

Micaela Santos, que é curadora do Museu Mineiro de São Pedro da Cova, lembra que também este tem origem na actividade do Centro Revolucionário, tendo sido criado em 1976, na cave dos escritórios ocupados. Em 1977, a Junta de Freguesia decide intervir e faz um acordo com a ainda existente Companhia das Minas no sentido de poder disponibilizar uma das casas que albergavam os trabalhadores de várias regiões do País que iam trabalhar para São Pedro da Cova, conhecidos por «malteses». 

Trabalhadores das minas de carvão de São Pedro da Cova na década de 60 do século XX Créditos

«A população residente não chegava para as necessidades das minas, quer pela qualidade do carvão, quer pela importância que o recurso energético foi adquirindo, e para estas minas migraram centenas de trabalhadores de outros pontos do País», lê-se no livro Quando o povo ocupou o que era seu, editado pela Lugar da Palavra. 

O CRM manteve-se em funcionamento até início dos anos 1980. Em 1989, o Museu Mineiro de São Pedro da Cova foi inaugurado numa das antigas Casa da Malta, onde permanece até aos dias de hoje.

A apresentação de Quando o povo ocupou o que era seu, cujos autores são netos de mineiros, realiza-se este sábado, pelas 18h, no auditório da Junta de Freguesia de São Pedro da Cova (Gondomar), dia em que se assinalam 46 anos da ocupação. 

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