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Com o IVA zero há valor acrescentado nas margens de lucro das distribuidoras

Alheio aos problemas, o Governo pintou uma realidade sua e paralela no debate de hoje no Parlamento. Entre medidas avulsas, ficou a certeza de que «as famílias» que vão beneficiar do IVA zero são as donas das grandes empresas.

O primeiro-ministro, António Costa, intervém durante o debate quinzenal na Assembleia da República, em Lisboa. 5 de Junho de 2018
CréditosMiguel A. Lopes / Agência Lusa

«Como sempre temos demonstrado, na atitude e nas acções, que sabemos bem e compreendemos bem as dificuldades das famílias e os desafios que enfrentam. Governamos para as pessoas e com sentido de compromisso com o país». Foi assim que o Governo começou o debate de hoje na Assembleia da República (AR).

Logo de seguida, António Mendonça Mendes, secretário de Estado-adjunto do Primeiro-Ministro, deu o exemplo cristalino de qual é a preocupação do PS: «O ano passado o investimento empresarial voltou a atingir máximos de trinta e dois mil milhões de euros, acima dos vinte e oito mil milhões de euros de 2021, já por si o valor mais alto». As famílias são as empresas e esta acaba por ser a tónica das propostas do Governo, nomeadamente a proposta do «IVA zero» e do acordo com a grande distribuição e grandes produtores.

Ignorando toda a contestação social, o Governo gabou-se do crescimento do PIB, do crescimento do emprego, do crescimento do emprego mais estável e de maiores remunerações. A «realidade» do Governo contrasta com a realidade de um país onde quem vive do seu trabalho está a ser fustigado pela inflação e a cada palavra de ordem clama por medidas urgentes e eficazes. O «pacto» assinado com «os agentes do sector» para enfrentar o «desafio da inflação» que «vai da produção à distribuição» não é, segundo o Governo, uma mera transferência de apoios às grandes empresas, mas sim para as famílias. 

Analisando medida a medida, vai-se aclarando a água. Acenando com o apoio às famílias (o tal apoio de 30 euros por mês), pago trimestralmente, o Governo PS esquece-se de dizer que esse apoio equivale apenas a mais 1 euro por dia nas carteiras das famílias, num mês de 30 dias. Não diz também o Governo que a bonificação de 15 euros por cada filho, caso um casal tenha apenas um, são apenas mais 0,50 cêntimos por dia, se o mês tiver, lá está, 30 dias. É aqui que o IVA zero esbarra na realidade, uma vez que, dados os valores das ajudas às famílias por dia, não será o IVA que fará a diferença nas suas vidas, assim como também não foi o IVA a causa da inflação e do aumento dos preços.  

Com a introdução do debate, não se pode dizer que o Governo não reconhece o aumento dos lucros dos grandes grupos económicos, até porque falando do crescimento do PIB numa altura de inflação e aumento do investimento privado, o executivo liderado por António Costa reconhece que há, então, quem esteja a ganhar com a situação. Quando confrontado com a recusa de tocar nos lucros excessivos, fixar preços e aumentar salários e não dar apoios pontuais, o Governo apenas diz que olhar para os problemas como se houvesse uma «dicotomia» é errado, dando a entender que os interesse de quem tem acumulado riqueza e de quem tem empobrecido (a trabalhar) são os mesmos. 

Falando em aumentos de salários de 7%, abaixo da inflação; falando de aumentos de rendimentos na Função Pública aquém do necessário; falando da importância de apoios pontuais, o Governo confirmou a sua falta de vontade em resolver os problemas de fundo. Tudo isto, conjugado com o IVA zero, deixa patente a salvaguarda que está a ser dada à acumulação de lucros.

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