|Agricultura

Agricultores perdem com a inflação enquanto outros lucram e muito!

Perante a subida acentuada da generalidade dos bens alimentares, muitos questionam se estes se justificam ou se não existe algum aproveitamento da conjuntura internacional.

CréditosAntónio Cotrim / Agência Lusa

Todos os portugueses sentem na pele e na carteira os efeitos da inflação nos produtos alimentares. O aumento dos preços dos bens alimentares tem sido muito superior à taxa média da inflação, chegando a evoluir em sentido contrário. Com efeito, a taxa de inflação homóloga dos produtores alimentares e bebidas não alcoólicas subiu de 20,56% em janeiro para 21,47% em fevereiro.

Em sentido contrário, a taxa média de inflação descia no mesmo período de 8,36% para 8,25%.Com esta escalada insuportável que afeta os agregados mais pobres, o governo ensaia as suas habituais manobras de propaganda, evitando beliscar os lucros dos grandes grupos económicos que estão a lucrar milhões com esta crise.

Rubricas2021 106 euros2022Pe 106 eurosVariação (%)
PRODUÇÃO VEGETAL6072,626109,020,6
PRODUÇÃO ANIMAL3053,823751,1722,8
PRODUÇÃO DE SERVIÇOS AGRÍCOLAS237,43248,724,8
ATIVIDADES SECUNDÁRIAS (NÃO SEPARÁVEIS)269,02277,723,2
PRODUÇÃO TOTAL DO RAMO AGRÍCOLA9632,8910386,637,8
CONSUMOS INTERMÉDIOS6074,927211,0118,7
VALOR ACRESCENTADO BRUTO3557,973175,62-10,7
Consumo de Capital Fixo912,03937,382,8
VALOR ACRESCENTADO LÍQUIDO2645,942238,24-15,4
Outros Impostos sobre a Produção51,2754,396,1
Outros Subsídios à Produção1004,251022,901,9
RENDIMENTO DOS FATORES3598,923206,75-10,9
Remuneração dos Assalariados1117,481215,478,8
EXCEDENTE LÍQ. DE EXPLORAÇÃO2481,441991,28 -19,8
Rendas a pagar36,6438,294,5
Juros a Pagar187,04195,144,3
Juros a Receber8,408,420,2
RENDIMENTO LÍQUIDO2266,161766,27-22,1
Tabela 1: Contas Económicas da Agricultura do INE (1a estimativa para 2022).

Perante a subida acentuada da generalidade dos bens alimentares, muitos questionam se estes se justificam ou se não existe algum aproveitamento da conjuntura internacional. A tabela que apresentamos, construída com os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) demonstram que os agricultores perderam e muito com a inflação, pelo que, se existe aproveitamento, serão outros a lucrar.

A quebra no rendimento líquido das explorações agrícolas em 2022 foi de 22%. Desde 2011 que o setor não apresentava uma quebra desta envergadura. Para esta quebra, terão contribuído os consumos intermédios, como por exemplo, os adubos, a energia e os alimentos compostos para os animais, todos eles com subidas superiores a 30%. Em contrapartida, os grandes grupos económicos ligados à distribuição ou à energia não param de anunciar lucros milionários. De acordo com os resultados dos primeiros 9 meses de 2022 (os resultados anuais estão por anunciar), os lucros da Sonae cresceram 33% face a 2021. O Grupo Jerónimo Martins e a Galp, viram também os seus lucros crescerem respetivamente 29,3% e 86% em igual período. Não são necessárias grandes contas para perceber quem tem lucrado com a inflação e quem continua a sugar a mais valia criada pelos agricultores.

«Vale a pena lembrar que este observatório, criado através do Despacho 12209/2022 de 6 de outubro, é em tudo idêntico a outro observatório criado para o mesmo efeito em 2015 pelo governo PSD/CDS. Só não sabemos se os direitos de autor foram pagos...»

Perante este cenário, o governo ensaia mais um número de propaganda, com meia dúzia de equipas da ASAE a inspecionar preços nos supermercados em direto para os telejornais. A ministra da Agricultura garante que o observatório de preços vai entrar em funcionamento. Vale a pena lembrar que este observatório, criado através do Despacho 12209/2022 de 6 de outubro, é em tudo idêntico a outro observatório criado para o mesmo efeito em 2015 pelo governo PSD/CDS. Só não sabemos se os direitos de autor foram pagos… Esta crise inflacionária veio mais uma vez pôr a nu este sistema iníquo que permite a uns engordar à custa do trabalho dos outros. Esta situação resolve-se com medidas firmes que imponham preços justos à produção.

Só com uma agricultura rentável poderemos garantir uma mais justa distribuição da mais-valia criada e inverter o declínio do mundo rural, atraindo jovens para este setor. Mas isto implica mexer com os interesses do capital e não será seguramente o PS com a sua maioria absoluta a dar o passo.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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