O assassinato de dez civis (entre eles, sete crianças) em Cabul, no Afeganistão, por parte das forças armadas dos Estados Unidos da América, foi reconhecido apenas alguns meses depois do ataque. O «acidente» acabou por ser atríbuido à forma negligente como os EUA recolheram e avaliaram a informação recolhida pelos seus serviços, que confundiram carros e não viram as crianças na habitação, minutos antes de a bombardearem.
Este novo caso já não pode ser imputado à irresponsabilidade geral que parece grassar no exército mais caro do planeta. Como relata a reportagem do The New York Times (NYT), houve um esforço concertado por parte do exército dos EUA para encobrir os bombardeamentos que mataram, pelo menos, 64 mulheres e crianças sírias, perto de Baghuz.
«Em quase todas as instâncias, o exército promoveu a ocultação do trágico ataque», afirma a reportagem. Em Março de 2019, um drone militar fazia um voo de reconhecimento na Síria num dos últimos acantonamentos do Estado Islâmico no país, identificando, à beira de um rio, um grande grupo de mulheres e crianças. Inesperadamente, um jacto F-15E surgiu na área.
O bombardeamento foi-se sucedendo perante a confusão dos militares que comandavam o drone e que não tinham sido informados sobre o ataque. «Mas quem é que os está a bombardear?» perguntou um deles, num grupo de conversa privado a que o NYT teve acesso, «Acabámos de largar bombas em cima de 50 mulheres e crianças», é a resposta.
A notificação feita de imediato por um responsável desse destacamento, que desencadearia uma potencial investigação a um crime de guerra, foi prontamente ignorada. «O número de mortos foi minimizado, os relatórios foram sendo atrasados, saneados, classificados». Eventualmente, a coligação internacial liderada pelos EUA terraplanou, com bulldozers, o local do crime.
O primeiro reconhecimento oficial por parte dos Estados Unidos da América sobre o ataque surgiu esta semana, depois do NYT enviar as imagens e documentos que recolheu e que comprovam o sucedido.
Reconhecendo a existência de mais de 80 mortes, apenas 16 seriam, de acordo com os EUA, soldados do Estado Islâmico (EI), a que acrescem quatro civis. Sobre as restantes 60 pessoas assassinadas a teoria adquire contornos mais absurdos e grotescos: As mulheres e crianças seriam também combatentes do EI e, como tal, devem ser contabilizadas como tropas inimigas, tudo em «legítima defesa».
Nos quase mil bombardeamentos levados a cabo pelas forças militares norte-americanas em 2019 (4729 bombas e mísseis) na Síria e no Iraque, os EUA reconhecem apenas a morte de 22 civis. Em nenhum momento é feita menção deste ataque, levantando sérias dúvidas sobre o real número de vítimas civis da acção intervencionista norte-americana na Síria e noutros países.
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