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MST: «2019 será sinónimo de luta e resistência»

Kelli Mafort, do MST, fala dos desafios de 2019 e do ano que termina, marcado pelo avanço da extrema-direita e a criminalização dos movimentos populares. «Apesar das condições adversas, resistimos», frisa.

Kelli Mafort, da direcção nacional do MST
Créditos / Página do MST

Entrevistada pela página do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a dirigente do movimento Kelli Mafort destacou que 2018 foi um ano violento para quem luta pela terra e pela Reforma Agrária: além dos assassinatos (o MST contabilizou dez), os sem-terra também enfrentaram despejos, «prisões políticas» (pelo menos 15 pessoas) e muitos processos, no contexto de tentativa de criminalização.

«Esse cenário revela um recrudescimento das forças conservadoras, dessa nova direita com características neofascistas, que avança contra a classe trabalhadora», frisou, alertando que, com a vitória de Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais, teme um aumento no processo de criminalização, quer pela via da classificação dos movimentos populares como «grupos terroristas», quer pela via do aparelho jurídico, que, denunciou, «já é historicamente usado contra o MST».

Para além disto, 2018 foi um ano difícil porque se tornaram patentes «as consequências do golpe», com cortes orçamentais e em programas sociais de apoio à agricultura familiar. «Já nos nossos acampamentos o corte foi ainda mais violento, não só do ponto de vista da obtenção de áreas, mas também de todo o rito de desapropriação, que envolve, por exemplo, a vistoria da terra, o cadastramento de famílias e o mapeamento de áreas», disse.

«Apesar dessas condições tão adversas, resistimos. E essa resistência pode ser traduzida em alguns números: só em 2018, nos assentamentos de Reforma Agrária, nós produzimos três milhões de litros de leite por dia, somos o maior produtor de arroz orgânico da América Latina, também produzimos 63 toneladas de feijão, 43 de café, realizámos mais de dez feiras estaduais, além da feira nacional, que já vai para o quarto ano», sublinhou.

Um ano também de lutas e conquistas

Pese embora ter sido um ano duro para os sem-terra, 2018 trouxe algumas conquistas para o MST, que completa 35 anos de existência em Janeiro. Kelli Mafort afirmou que, na «trajectória de histórica luta pela terra, a educação foi uma das principais bandeiras» do MST. «Nós sempre acreditámos na educação como forma de romper as cercas do saber. Em 2018, tivemos o prazer de formar sete turmas de graduação nos cursos de Direito, História, Serviço Social, Veterinária, Agronomia e Pedagogia», e outras «61 turmas estão em andamento», destacou.


Também no ano que agora finda, «25 mil pessoas foram alfabetizadas através do programa "Sim, eu posso!"» e o MST comemorou «20 anos do Pronera (Programa Nacional de Educação da Reforma Agrária)», que deu formação a 187 mil pessoas. «A formação política é sem dúvida a grande conquista do MST, uma conquista que se multiplica cada vez mais», declarou.

A dirigente nacional dos sem-terra valorizou ainda a intensa participação do movimento em «todas as lutas sociais empreendidas no país», tendo destacado, entre outras, as mobilizações por «Lula Livre» – cerca de 200 pessoas ligadas ao MST mantêm-se na Vigília Lula Livre em Curitiba desde o seu início, em Abril, e lá vão continuar até que o ex-presidente seja libertado – e a realização de uma grande marcha, que contou com 50 mil pessoas ao cabo de cinco dias de caminhada.

2019, sinónimo de luta e resistência

Mafort destacou a «força, resistência e ousadia» demonstrada pelas mulheres em 2018, empenhadas em várias lutas: a denúncia da acção das transnacionais, a da apropriação da água por empresas como a Nestlé e a Coca Cola, a campanha em torno do «Ele não», e, naturalmente, a luta contra a violência crescente em todo o Brasil e que «atinge principalmente as mulheres e os sujeitos LGBT», frisou. Face à «campanha machista, racista, misógina e lgbtfóbica» actualmente em curso, Mafort prevê que «as mulheres vão chegar com força a 2019».

Questionada sobre a mensagem que pretende deixar, a dirigente nacional do MST, defendeu a «resistência activa». E explicou: «Isso significa que nós vamos continuar a fazer o que aprendemos, que é resistir mesmo em condições adversas. É importante olhar para a nossa trajectória e ver que nós já passámos por períodos difíceis em que resistimos e crescemos.»

Sublinhando que «o MST é um dos maiores movimentos populares da América Latina», acrescentou à «mensagem» para 2019: «Somos organizados e vamos juntos superar as adversidades. Para isso, é importante atentarmos a três tarefas básicas: o trabalho de base, a formação política e também o fortalecimento das lutas, sejam elas no campo ou na cidade.»

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