Dia do Estudante – 55 anos da crise de 62

Do «decreto 40 900» ao luto académico – a crise de 62

Há 55 anos, os estudantes de Lisboa eram brutalmente reprimidos pela polícia, dando início ao luto académico e à crise de 62. A greve alcançou 25 mil estudantes, de acordo com relatos da época.

Crise Académica de 1962, Lisboa.
Créditos

A 24 de Março de 1962, os estudantes de Lisboa começam um desfile da Cidade Universitária em direcção ao Campo Grande, onde, numa manobra para desmobilizar o protesto estudantil, o reitor Marcello Caetano prometera um jantar.

É sobre este desfile que cai uma violenta repressão da polícia que tinha entrado no recinto da Universidade, como conta Albano Nunes, à época secretário-geral da Reunião Inter-Associações (RIA), em artigo no Militante.

No dia seguinte realizam-se grandes reuniões e no dia 26 dá-se início ao luto académico sob a palavra de ordem «Ofenderam-te? Enluta-te!», com enormes plenários, reuniões, desfiles, greves às aulas. O governo fascista responde com mais violência da polícia de choque, resultando na prisão e expulsão de centenas de estudantes. A partir desse ano, o 24 de Março passa a ser o Dia do Estudante, sendo reconhecido pela Assembleia da República em 1987.

O movimento estudantil e a democratização do ensino

As lutas estudantis dos anos 60, nomeadamente a crise de 62, beneficiaram da experiência acumulada e da luta durante a ditadura fascista, desde os anos 30: com os Comités de Defesa Académica, a eleição de Álvaro Cunhal para o Senado da Universidade de Lisboa, o relançamento das Associações de Estudantes nos anos 50 e a criação das Comissões Pró-Associação onde estas eram proíbidas e encerradas.

A luta contra o «decreto 40 900» em 1957, que pretendia esvaziar e governamentalizar todo o movimento associativo estudantil, permitiu que, pela primeira vez, a Assembleia Nacional fascista revogasse um decreto governamental após a intervenção do movimento estudantil.

A par da experiência acumulada, surgiam ecos da luta anti-imperialista em Cuba, na Argélia ou no Vietname, enquanto em Angola eram dados os primeiros passos na luta contra o colonialismo português. As eleições presidenciais de 1958, com a candidatura de Humberto Delgado, e as lutas dos trabalhadores contra o fascismo (que culminaram no 1.º de Maio de 1962) criaram condições favoráveis ao protesto estudantil.

Mas as reivindicações estavam intimamente ligadas com a vida da Universidade, como hoje acontece. Naquele ano de 1962, os estudantes lutavam pela democratização do acesso ao ensino - em 1959 apenas 2,9% dos estudantes universitários eram filhos de trabalhadores - e igualmente pela liberdade de organização dos estudantes nas suas Associações.

1962: iníco da onda de lutas estudantis que atravessaram a Europa nos anos 60

As lutas estudantis de 62 são inseparáveis do clima de ascenso da luta popular e democrática contra o fascismo: das manifestações contra a farsa eleitoral de 1961 em Almada, na Covilhã e em Alpiarça; das lutas dos assalariados agrícolas do Sul pelas 8 horas; das manifestações do 31 de Janeiro e do 8 de Março no Porto; da manifestação do 1.º de Maio em Lisboa.

O ano de 1962 é ainda marcado pela ocupação das instalações da Associação Académica de Coimbra (decidida em reunião magna, em Maio) e da Cantina da Universidade de Lisboa, em solidariedade com 80 estudantes que faziam greve da fome.

A repressão com que as forças fascistas responderam a todas as formas de luta e reinvidicações dos estudantes tiveram como efeito o seu contacto, em muitos dos casos pela primeira vez, com a verdadeira face do regime. Esta tomada de consciência levou a uma crescente politização dos estudantes e a uma identificação da sua luta e dos seus objectivos com a luta dos trabalhadores e do povo português pela liberdade e a democracia.

Ao contrário do que o regime tentou através dos seus instrumentos (nomeadamente dos órgãos de comunicação que tinha na mão), os estudantes sempre contaram com a simpatia e mesmo solidariedade da população, de diversos sectores, e mesmo de vários professores.

A crise de 62 inaugurou a onde de lutas estudantis que atravessaram a Europa nos anos 60. Cinquenta e cinco anos depois, o Dia do Estudante em Portugal permanece como dia de luta, das reivindicações dos estudantes do Ensino Superior.


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