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|habitação

Turistificação, gentrificação transnacional e a produção capitalista do espaço urbano

Turistificação, gentrificação, financeirização da habitação, especulação imobiliária, desalojamentos e crise de habitação são apenas faces do mesmo Leviatã, o Capital.

Créditos / Land Portal

É inegável que a cidade de Lisboa viveu na década compreendida entre 2009 e 2019 um pico de projecção internacional enquanto destino turístico, ao mesmo tempo que o seu mercado de habitação adquire formatos de activo financeiro e atraiu dinâmicas globais de procura e de investimento estrangeiro. Este processo foi alavancado por programas governamentais e pela viragem neoliberal na política urbana, que fomentaram a atração de uma elite transnacional e favoreceram a financeirização do imobiliário e a reestruturação urbana na capital portuguesa.

Assistiu-se a uma intensa gentrificação turística, mediante a transformação dos bairros populares e históricos da cidade centro em locais de consumo e turismo, pela expansão da função de recreação, lazer ou alojamento turístico / arrendamento de curta duração que substituiu gradualmente as funções tradicionais da habitação para uso permanente, arrendamento a longo prazo e o comércio local tradicional de proximidade, agravando tendências de desalojamento e segregação residencial.

Os bairros do centro histórico, prosseguindo um processo de despovoamento que data de há 50 anos a esta parte, continuam a ser esvaziados da população que os ocupou durante décadas ou impede-se a população de baixo estatuto socio-económico de aceder à habitação nessas áreas, colocando em risco a sustentabilidade social do centro histórico, à medida que parecem perder o tecido social e económico que lhes conferia identidade, memória comunitária, desmembrando e alienando os residentes e a respectiva rede social primária de vizinhança, onde existia solidariedade, entreajuda, camaradagem, apoio mútuo. 

Fala-se bastante do fenómeno da turistificação e da expansão hegemónica do alojamento local nos bairros centrais históricos de génese popular e de classe trabalhadora, mas a par desta há que considerar as dinâmicas do complexo imobiliário-financeiro, como sendo um eixo fundamental para a recuperação da economia urbana pós-crise capitalista, no caso de Lisboa, e como alimentaram processos de supergentrificação alimentados pelas lógicas de financeirização da habitação e do imobiliário, acompanhando a injeção de capital transnacional no ambiente construído lisboeta, provocando graves distorções no mercado de habitação local, agravando, por isso, tendências de segregação residencial, exclusão territorial e injustiça socio-espacial.

«Os bairros do centro histórico, prosseguindo um processo de despovoamento que data de há 50 anos a esta parte, continuam a ser esvaziados da população que os ocupou durante décadas ou impede-se a população de baixo estatuto socio-económico de aceder à habitação nessas áreas (...).»

A viragem neoliberal nas políticas urbanas inicia-se em 2004 (destacando-se, inicialmente, a criação das sociedades de reabilitação urbana) – ainda antes da actual crise de habitação e do próprio desencadear da crise capitalista de 2008-2009 – com a aprovação de uma série de pacotes legislativos que foram surgindo sucessivamente, promovendo uma visão pró-mercado no que respeita à habitação, o que favorecia a iniciativa privada, as parcerias público-privadas e a competitividade no sector.

Este processo culmina com a aprovação do Novo Regime do Arrendamento Urbano, em 2012, em conjunto com a simplificação da Lei do Alojamento Local, em 2014, e com os pacotes para atracção de investimento estrangeiro, tais como o regime fiscal muito favorável para os residentes não habituais (estabelecido em 2009 e que tem como premissa de partida os acordos bilaterais destinados a evitar a dupla tributação fiscal), o programa dos denominados Vistos Gold, os Real Estate Investment Trust (REIT), as Sociedades de Investimento e Gestão Imobiliária (SIGI) e as isenções fiscais para os Fundos de Investimento Imobiliário. Importa ainda referir o regime excepcional e temporário de reabilitação urbana no sentido da agilização e dinamização que flexibiliza e simplifica os procedimentos de criação de áreas de intervenção e de controlo prévio das operações urbanísticas de 2014, bem como a liberalização operada ao nível do Plano Diretor Municipal de Lisboa nos últimos anos.

Estas alterações reorientaram o interesse especulativo de uma elite transnacional, juntamente com o forte crescimento da procura turística na cidade de Lisboa e a disponibilidade de um parque habitacional, parcialmente desocupado e em avançado estado de degradação, que cria oportunidades de gerar mais-valias para a especulação imobiliária mediante rentabilização da rent gap. Assim se gerou uma «tempestade perfeita» que introduziu distorções significativas no mercado de habitação, ao nível do segmento de habitação acessível para residência permanente ou para arrendamento de longa duração, gerando a crise de habitação mais recente e todo um conjunto de injustiças socioespaciais agravadas pela crise pandémica e pela actual crise inflacionária.

Turistificação, gentrificação, financeirização da habitação, especulação imobiliária, desalojamentos e crise de habitação são apenas faces do mesmo Leviatã, o Capital; alargando as fronteiras diabólicas, desumanas, predatórias, rentistas, extractivistas, excludentes de uma produção capitalista da cidade contemporânea, e cujos agentes dominantes estão já há muito identificados: a Banca, os grupos do grande capital, grandes proprietários, promotores e investidores imobiliários e o Estado Capitalista e Neoliberal.

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