O início da operação das máquinas chinesas na região Nordeste do Brasil pode ter um impacto positivo no trabalho das agricultoras. A apreciação é das próprias trabalhadoras, que esperam que, com a chegada da maquinaria, possa diminuir o tempo de trabalho e aumentar o rendimento da produção.
«Infelizmente, as mulheres têm jornada tripla, né? Elas trabalham na roça, elas trabalham em casa e muitas vezes ainda têm que ir para a feira. Muitas vezes ainda estudam. E isso [as máquinas chinesas] vai otimizar o nosso tempo na roça porque a gente também precisa ir para a feira, a gente também precisa vir para os encontros do movimento para mostrar a nossa produção e ainda precisamos de outra coisa que é a logística de mercado», disse Antônia Diana da Silva, agricultora e moradora no Assentamento São Romão, na cidade de Mossoró (Rio Grande do Norte).
«É um sonho também do agricultor e da agricultora familiar essa mecanização do campo. Enquanto eu limpo uma carreira com a enxada, eu vou limpar quatro com a máquina», afirma a trabalhadora, referindo-se ao grande salto que os equipamentos podem proporcionar ao cultivo familiar e para a agroecologia.
«Dá pra usar a máquina pra tudo. Dá sim pra usar essas máquinas na produção agroecológica, trazendo alimento de qualidade e sem agrotóxico para mesa do trabalhador e para mesa da população brasileira», acrescenta.
Início da operação
Na sexta-feira passada, iniciou-se a operação em solo brasileiro dos equipamentos fabricados por empresas chinesas, durante uma demonstração na cidade de Apodi (Rio Grande do Norte). O acto contou com a presença do ministro brasileiro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira, e da governadora do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra (ambos do PT), além de dirigentes sindicais e de movimentos populares, indica o Brasil de Fato.
Esta iniciativa faz parte de uma parceria entre o Brasil e a China, alinhavada pelos movimentos populares e o Consórcio Nordeste. O acordo teve início em 2022, quando o Consórcio assinou um memorando de entendimento com o Instituto Internacional de Inovação de Equipamentos Agrícolas e Agricultura Inteligente da Universidade Agrícola da China, e a Associação de Fabricantes de Máquinas Agrícolas do país asiático. Também foi subscrito pela Associação Internacional para a Cooperação Popular (conhecida como Baobá).
«Os companheiros da China têm um compromisso connosco: a partir das máquinas que nós acharmos que são importantes, eles ajudarão a implantar fábricas de máquinas para a agricultura familiar aqui no Nordeste», apontou João Pedro Stédile, da direcção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
«Não tem política bem-sucedida sem participação dos movimentos sociais. O MST é quem sugeriu e ajudou a viabilizar essa parceria», explicou o ministro Paulo Teixeira, durante uma conferência de imprensa em Apodi.
Por seu lado, a professora Yang Minli, da Universidade Agrícola da China e uma das principais intervenientes neste intercâmbio, citou as semelhanças entre as realidades do Brasil e da China, e enalteceu a parceria entre os dois países.
«Tanto a China como o Brasil são grandes países agrícolas. Nos últimos anos, a nossa parceria em agronegócio vem crescendo e cada um se beneficia com essa transacção comercial. Porém, devemos lembrar que a China, apesar de ser um grande país, tem uma agricultura pequena, tal como aqui. A nossa agricultura fica a cargo de pequenas famílias, como aqui no Nordeste», disse, citada pelo Brasil de Fato.
Agora, a ideia é testar a eficiência destas máquinas que vêm da China em solo brasileiro. «Vamos analisar a quantidade de combustível que se consome, o desgaste das peças, a manutenção, ver o seu desempenho dentro do campo, seja na colheita do arroz, seja na questão do manejo da terra. A ideia desse campo de testagem é ver sua eficiência no campo para daí fazermos as sugestões possíveis de adaptação», explicou Maria da Saúde, do sector de produção do MST, em Pernambuco.
Desenvolvimento do Nordeste
A expectativa, segundo João Pedro Stédile, é avançar na construção de unidades fabris nos estados nordestinos. Durante o discurso no acto político em Apodi, na sexta-feira, Stédile criticou o mercado concentrado de máquinas no Brasil e explicou como esse cenário é um grande obstáculo para a agricultura familiar camponesa.
«Aqui no Brasil tem oito fábricas de tractor. Na China tem oito mil. Aqui no Brasil não tem nenhuma fábrica de fertilizante orgânico. Na China tem mil e duzentas fábricas de fertilizantes orgânicos e faz o adubo com matéria orgânica, com o que sobra das famílias, dos restaurantes», disse.
«Sem fábrica no Nordeste, nós não teremos mecanização. Nós queremos que essas fábricas venham para cá para o Nordeste, venham para o Rio Grande do Norte, para que nós possamos ampliar a oferta de mecanização com preço justo», explicou Alexandre Lima, Secretário de Agricultura Familiar do Rio Grande do Norte.
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