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Trump e a Rússia

Acumulam-se evidências de uma relação entre a equipa de Trump e a Federação Russa. A natureza dessa relação não é clara. Mas as mentiras sobre a sua existência estão a assumir dimensões que levantam fortes suspeitas.

Ainda durante a campanha eleitoral, piratas informáticos russos (hackers) conseguiram obter correios electrónicos do Comité Nacional Democrático e da conta pessoal de John Podesta, um importante conselheiro de Hillary Clinton, e estes foram sendo divulgados através do WikiLeaks. Questionado sobre a quebra de segurança e os seus elogios a Vladimir Putin, Trump respondeu em Julho que não tinha investimentos na Rússia.

Na verdade, Trump tem diversas relações financeiras com investidores e instituições russas, pois após as suas várias bancarrotas, os bancos nos EUA recusaram-lhe crédito, forçando-o a procurá-lo noutros locais, como o Deutsche Bank (seu maior credor; ver abaixo), ou o grupo financeiro Bayrock, de capital russo envolvido em actividades criminosas. Já depois da eleição, surgiram alegações de que os piratas haviam actuado segundo directivas do governo russo, com a intenção de favorecer a vitória de Trump.

Em Janeiro surge um dossier, escrito por Christopher Steele, um antigo espião, sugerindo uma «conspiração bem desenvolvida» entre Trump e o governo russo, que a Rússia possuía informação comprometedora sobre Trump, que ofereceram a Trump a possibilidade de comprar 19% das acções da companhia petrolífera Rosneft, e que tinham decorrido contactos entre oficiais russos e a equipa da campanha eleitoral de Trump, incluindo um encontro em Agosto, em Praga, entre Oleg Solodukhin e Michael Cohen, advogado de Trump.

Cohen negou este encontro. Trump negou todas as alegações. Mas em Dezembro aquela fracção da Rosneft foi de facto comprada, numa das maiores privatizações na Rússia desde os anos 1990, e a identidade do comprador não é conhecida. Foram abertas duas investigações sobre as ligações entre a campanha de Trump e a Rússia, uma conduzida pelo FBI e outra pela Comissão de Inteligência da Casa de Representantes, dirigida por Devin Nunces, um Republicano.

Em Fevereiro, o The New York Times noticiou que agências estado-unidenses numa operação de contra-inteligência haviam interceptado comunicações entre a campanha de Trump e agentes russos. A notícia foi negada e rotulada de «falsa notícia» pela Casa Branca.

Segundo a CNN, o chefe de gabinete de Trump, Reince Priebus, contactou o director e subdirector do FBI, James Comey e Andrew McCabe, respectivamente, pedindo-lhes para desmentirem a notícia do Times. Recusaram-se fazê-lo publicamente, acabando por consentir citações anónimas, apesar de contactos entre o FBI e a Casa Branca sobre investigações em cursos sejam proibidas. Mas ao fazê-lo acabaram por confirmar a existência de uma investigação envolvendo elementos da equipa do presidente.

Estes contactos já tiveram uma vítima política. Michael Flynn foi apontado como Conselheiro de Segurança Nacional de Trump em Janeiro. Ainda antes de assumir o cargo, o Washington Post noticiou que Flynn tivera contactos telefónicos com o embaixador russo nos EUA, Serguei Kislyak, no dia em que Obama anunciou a expulsão de 35 diplomatas russos como resposta à alegada pirataria informática.

« Já depois da eleição, surgiram alegações de que os piratas haviam actuado segundo directivas do governo russo, com a intenção de favorecer a vitória de Trump.»

Flynn negou ter discutido as sanções, mas em Fevereiro Flynn foi demitido por se ter tornado claro que tinha falado sobre sanções com o embaixador e logo mentido sobre as chamadas numa entrevista com o FBI e mesmo a membros da administração Trump, em particular ao vice-presidente Mike Pence.

No decurso da operação de contra-inteligência, verificou-se que as comunicações interceptadas entre membros da comunidade de inteligência russa continham referências frequentes a Paul Manafort, um lobista que já trabalhou para Ferdinando Marcos, das Filipinas, Mobutu Sese Seko, do Zaire, Jonas Savimbi e, mais recentemente, Yanukovich, na Ucrânia.

Manafort havia trabalhado nas campanhas de Reagan, Bush e Dole mas estava relativamente afastado da política nos EUA, mas foi escolhido para liderar durante vários meses a campanha de Trump durante 2016. Durante a campanha eleitoral, Manafort manteve contactos frequentes com agentes russos, mas afirma que não tinha conhecimento que eram agentes. Acabou por se demitir do cargo quando surgiram indícios que terá recebido quase 13 milhões de euros do partido de Yanukovich como parte de um esquema de corrupção.

Esta semana, o Washington Post noticiou que em Julho e Setembro o recém-confirmado Procurador-Geral Federal, Jeff Sessions, na altura senador, teve também contactos com Kislyak. Podendo os conteúdos dos contactos ser legítimos, os esforços feitos para os ocultar são suspeitos. Sessions poderá ter contactado Kislak enquanto membro da comissão senatorial das forças armadas, mas nenhum outro membro da comissão teve tais contactos, ou teve conhecimento deles. O conteúdo das conversas poderá ser muito relevante, até porque Sessions mudou radicalmente de posicionamento face à Rússia por volta da altura em que se associou à campanha de Trump.

Numa sua sessão de confirmação, em Janeiro, perguntaram a Sessions o que faria se alguém afiliado com a campanha de Trump tivesse tido contacto com o governo russo durante a campanha, ao que ele respondeu: «Não tenho conhecimento dessas actividades. Tenho falado pela campanha umas vezes e não tive comunicação com os russos». Mas tarde reiterou a negação por escrito em resposta a novas perguntas. Em resposta à revelação de perjúrio ao Senado, vários congressistas democratas e organizações pediram a demissão de Sessions.

Inicialmente Sessions, com o apoio de Trump, respondeu dizendo que, enquanto procurador-geral, não se irá afastar de qualquer investigação sobre o envolvimento russo nas eleições e que as conversas não foram relevantes para a campanha de Trump. Ainda ontem, face à pressão pública e às exigências de congressistas, inclusive Republicanos, Sessions acabou por pedir escusa da investigação do FBI.

Esta semana foi também a confirmação de Wilbur Ross como Secretário do Comércio, mais um bilionário no gabinete. Entre outros atributos, Ross era vice-administrador do Banco do Chipre desde 2014. Durante a sua confirmação surgiram perguntas sobre a ligação entre este banco e a campanha de Trump e a Rússia, mas Ross foi confirmado sem nunca dar resposta às questões.

Em 2014, Ross investiu 400 milhões de euros no banco em 2014, tornando-se o seu maior accionista, e recrutou Josef Ackermann para o dirigir. Membro do direcção do Grupo Bilderberg, Ackerman havia deixado o Deutsche Bank em 2012. Banco este que acaba de ser multado por lavagem de dinheiro russo, cerca de 10 mil milhões de euros da Rússia para offshores, entre 2012 e 2015. As autoridades de regulação financeira da Grã-Bretanha e EUA multaram o banco em cerca de 600 milhões de euros  (uma das maiores multas desta natureza). A Rússia multou o banco, pelas mesmas actividades, no total de cinco mil euros. De referir que o Deutsche Bank é também o maior credor de Trump, estimada em 350 milhões de euros.

Associado a este processo de lavagem de dinheiro está também o Banco do Chipre. O banco tem estreitas ligações com o capital russo. Entre os seus investidores encontram-se Viktor Vekselberg, bilionário, dono do grupo Renova, amigo próximo de Vladimir Putin; e Dmitry Rybolovlev, outro bilionário russo, que em 2008 comprou uma casa a Donald Trump por quase 100 milhões de dólares, uma das maiores transações imobiliárias nos EUA, e mais do dobro do que Trump acabara de pagar pela casa.

A venda deu-se sem que Rybolovlev e Trump se tenham alguma vez comunicado directamente. O elo de ligação mais evidente entre os dois é Ross, o novo secretário de comércio. Rybolovlev estava na altura num processo dispendioso de divórcio, procurando dificultar o acesso à sua riqueza. Trump estava nesse momento em algumas dificuldades financeiras, em particular para pagar a sua dívida na ordem de 40 milhões de dólares ao Deutsche Bank pela compra de um prédio em Chicago, quantia muito semelhante ao oportuno lucro de Trump na venda da casa a Rybolovlev.

A grande questão, ainda pouco clara, é a natureza das ligações entre a equipa de Trump e a Rússia. O padrão de mentira e omissão sobre os contactos sugere que os motivos serão politicamente comprometedores. Mas poderão consistir em convergência de interesses financeiros até concertação na pirataria russa durante a campanha.

O caso vai, porém, assumindo uma dimensão grave e expõe a contradição entre, por um lado, a retórica nacionalista e anti-imigração de Trump, suas medidas securitárias e apoio às forças policiais, o enorme aumento previsto para a defesa (54 mil milhões de dólares) e, por outro lado, os interesses transfronteiriços do grande capital financeiro, incluindo os de Trump, a Goldman Sachs que o apoia e os multi-milionários no seu gabinete.

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