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Sobre a democracia dos cliques (2)

Na sequência do artigo de há 15 dias, «Sobre a democracia dos cliques», dois dos principais promotores do projecto «Fórum dos Cidadãos», Paulo Almeida, investigador no Instituto Gulbenkian da Ciência, e Manuel Arriaga, professor convidado na Universidade de Nova Iorque, enviaram-nos um conjunto de esclarecimentos respondendo às perguntas nele formuladas.

Créditos / Slate

Embora esta série de artigos tenha como objecto os media, e designadamente as práticas profissionais dos jornalistas e as condições de produção, sem evitar incursões no campo político, será útil olharmos para essa contribuição.

Recordemos o essencial. O «Fórum», apresentado como «um dos instrumentos para regenerar o sistema» democrático e apoiado por um leque de personalidades que «abarca todo o espectro político português, reuniu um painel de 15 cidadãos «representativo» da sociedade portuguesa que elaborou três propostas para melhorar a comunicação com os políticos, duas das quais assentes na «participação» à distância, através de plataformas digitais.

Paulo Almeida e Manuel Arriaga reconhecem que, com tal dimensão, o painel de 15 cidadãos «nunca poderá ser "representativo" da população portuguesa em toda a sua diversidade», embora creiam que, «usando boas técnicas de amostragem, um painel desta dimensão pode dar a ouvir a voz, informada e reflectida, de um conjunto de cidadãos no qual muitos portugueses se poderão com facilidade rever e identificar».

Para constituir o painel, foi fornecido um perfil demográfico «de forma a corresponder à população adulta portuguesa», mas «houve várias limitações na forma como foi construída a amostra neste piloto», não tendo sido possível, esclarecem, «corrigir em tempo útil o enviesamento» traduzido na sobre-representação de licenciados ou mestres (46,6% dos participantes).

Quanto à presença de «gestores» (40% do grupo), os promotores explicam que se tratou de uma «tentativa algo infeliz de resumir as ocupações de seis participantes diferentes» – por exemplo, «um técnico superior operacional de compras, um funcionário de uma fundação, um contabilista e duas pessoas que trabalham na área de vendas».

A insuficiente representação da diversidade política dos palestrantes é explicada com o facto de apenas um deputado (Ricardo Baptista Leite, do PSD) ter respondido ao convite todas as bancadas «presentes no Grupo de Trabalho para o Parlamento Digital da Assembleia da República», pelo que os promotores tentaram «colmatar essa falha convidando um representante de outro partido com reconhecida experiência na área da tecnologia e política» (José Magalhães, ex-deputado do PS).

Paulo Almeida e Manuel Arriaga admitem igualmente a ausência de personalidades de outros campos entre os apoiantes do projecto anunciados, no entanto, como cobrindo «todo o espectro» partidário. Assegurando que «um dos principais propósitos de ter uma lista de apoiantes diversa é poder, no futuro, contar com o seu contributo para garantir esta diversidade e a imparcialidade do processo deliberativo», reconhecem que, «até agora esta lista sofre de uma limitação importante: gostaríamos, especificamente, de contar com o envolvimento de um nome da CDU».

Embora iniciativas como o «Fórum» nasçam, «precisamente, porque os cliques não bastam» e «um dos autores já no passado escreveu sobre as limitações da "democracia dos cliques", para usar a apta caracterização» usada no artigo em causa, os subscritores observam que «as propostas foram elaboradas no contexto de um breve piloto com a duração de apenas dois dias» e que «múltiplos aspetos terão de ser detalhados e aperfeiçoados».

Quanto ao número de «Conselhos de Cidadãos» a criar para elaboração de pareceres - prévios à votação pelos deputados – sobre iniciativas legislativas que suscitassem maior interesse dos internautas, os promotores concluem que «seriam constituídos tantos (…) quantos os que ditassem as regras» e assumem que, «sem dúvida, (os custos) seriam significativos», pois «uma verdadeira democracia tem custos». «O mesmo é verdade de um sistema público de educação que assegure uma formação de qualidade para todos ou um sistema nacional de saúde que providencie bons cuidados médicos a toda a população», argumentam.

«Apenas um conjunto muito restrito de figuras ditas "influentes" tem a possibilidade de ser parte activa destes processos de formação de opinião nos órgãos de comunicação social»

Quanto à constituição dos «conselhos», Paulo Monteiro e Manuel Arriaga assumem que, afinal, os cinco peritos poderiam ser designados pela Assembleia da República, sendo os restantes 15 «seleccionados aleatoriamente» através de «um método aceitável para os partidos políticos e para os cidadãos em geral, tal como nas eleições».

Os «moderadores independentes» desses conselhos «seriam facilitadores treinados», adiantam os autores, invocando a «vasta experiência internacional na formação e avaliação destes profissionais» e a existência de «protocolos de moderação supervisionada que permitem reduzir os riscos de "enviesamento" da discussão».

«Como em qualquer outro sistema onde indivíduos desempenham funções de responsabilidade com base no seu juízo e avaliação pessoais (pensemos, por exemplo, nos tribunais), o que é importante é criar procedimentos que assegurem globalmente a robustez do processo deliberativo», acrescentam. «Ter um processo que decorra em condições de transparência e escrutinável tanto por partidos políticos como pelos cidadãos seria uma boa forma de combater receios quanto à sua imparcialidade».

A criação desses conselhos «seria assumidamente uma forma de pressão sobre os deputados, que teriam em conta as recomendações (…), e pesariam eventuais custos políticos de não as considerarem. Ora, esta pressão não nos parece em nada ser mais "ilegítima" do que os incontáveis processos de influência e formação de opinião que ocorrem na sociedade civil e órgãos de comunicação social todos os dias».

Fazendo notar que «apenas um conjunto muito restrito de figuras ditas "influentes" tem a possibilidade de ser parte activa destes processos de formação de opinião nos órgãos de comunicação social», os promotores sustentam que «um processo como o sugerido nesta proposta permitiria a um conjunto muito diferente de vozes fazer-se ouvir sobre os temas que andam a ser discutidos entre a classe política».

Relativamente aos «verificadores» que avaliariam o desempenho do Governo, os subscritores esclarecem que «estariam ligados à academia e (ao) jornalismo, duas áreas em que já desempenham este papel», mas que «seria certamente importante criar mecanismos e processos que assegurem a imparcialidade do processo e a razoabilidade dos resultados».

«É útil realçar que esta questão -- "quem irá vigiar os vigilantes?" -- tem milénios e as sociedades, ao longo do tempo, foram desenvolvendo "redes" de mecanismos, distribuídos por diferentes actores, para lidar com esse desafio. Estamos aqui perante a mesma tarefa: importante, dependente de difíceis juízos individuais -- mas possível de resolver (com o qual queremos dizer "minimizar os riscos")».

Já quanto à necessidade de acordo das várias forças políticas aos «verificadores e explicadores», adiantam que «seria tácito e não teria valor operacional» e a aceitação «seria testada por cada verificação que emanasse da plataforma, e só seria mantida se houvesse uma impressão de imparcialidade a longo prazo».

Não sabemos que aceitação terão as propostas em causa junto do Parlamento – de quem dependerá, feitas as contas, a eventual concretização da experiência de «democracia dos cliques» – mas os esclarecimentos prestados e o caderno de intenções do projecto justificam uma atenção séria e verdadeira mediação por parte dos media. Sem esquecermos que a participação dos cidadãos na vida política e partidária existe na vida real.

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