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A diversidade na Arte

A afirmação da autonomia e compromisso na arte contemporânea na XX Bienal da Festa do «Avante!».

Estamos em 1977, período em que acontecem diversas «Acções Colectivas» e «Novas Relações Arte-público»1 na arte portuguesa, mas também é um período, como refere Rui Mário Gonçalves, em que «os muros são apagados, os governos recolhem-se aos seus gabinetes…» sem assumirem uma política cultural para o país, apesar das diversas propostas que os artistas continuaram a apresentar, propostas que nunca foram consideradas como sendo prioritárias. É neste contexto, e neste ano, que se realiza a primeira Exposição de Artes Plásticas na Festa do Avante!, uma grande manifestação artística colectiva, assumindo particular referência às obras de João Hogan, Jorge Vieira, Bartolomeu Cid e Rogério Ribeiro entre um grande número de artistas, que muito contribuiu para a criação de uma nova dinâmica de relações entre a arte e o público.

Uma das principais inovações da primeira exposição na Festa do Avante!, que na sua segunda edição, em 1979, adquiriu um estatuto de Bienal, foi a de «colocar os milhares de pessoas que acorriam à Festa em confronto com obras de arte que para muitas lhes eram distantes ou mesmo quase desconhecidas por se encontrarem confinadas aos espaços, museus e galerias…»2, e assim veio a acontecer de forma ininterrupta de dois em dois anos até à actualidade, onde já participaram nomes de destaque nacional como Abel Manta, Rogério Ribeiro, Sá Nogueira, Jorge Pinheiro, Armando Alves, Bartolomeu Cid dos Santos, Maria Keil, Carlos Botelho, Jorge Vieira, Júlio Pomar, Helena Almeida, Costa Pinheiro, Ângelo de Sousa, Teresa Magalhães e Augusto Cabrita e, a nível internacional, nomes como Sebastião Salgado, Malangatana ou Óscar Niemeyer, entre muitos outros.

A Comissão de Artes Plásticas do Avante!, para além da organização das bienais durante estes 20 anos, tem também assumido diversas intervenções artísticas nos anos intercalares, das quais salientamos a Exposição Internacional de Fotografia «Objectiva 86», a Exposição Internacional de Artes Plásticas «Que Viva Abril», em 1994, a exposição do arquitecto brasileiro Óscar Niemeyer, em 1998, a Exposição Internacional de Gravura, a Mostra «Comunic@to – arte e comunicação na política», em 2006, e a Exposição Documental «Rupturas Anos 70», em 2014.

Quando, na II Bienal da Festa do Avante!, em 1979, no texto de apresentação, Manuel Augusto Araújo afirmava que «a História da Arte tem a sua especificidade, a sua autonomia relativa, as suas leis, mas através delas rasgam o seu caminho as leis gerais da História das sociedades humanas», também hoje a questão da autonomia da arte continua a ser um das afirmações da Bienal da Festa do Avante!. Autonomia que continua a não ser respeitada por um sistema de arte que se caracteriza cada vez mais pela elitização, pela ausência de pensamento crítico ou estético num contexto de globalização hegemónica, impondo-se através de uma acentuada especulação e diluição do conceito e ideia de arte propondo um certo nivelamento espectacular e de consensos, tentando sobrepor-se às afirmações das identidades locais e à defesa da diversidade tanto das linguagens artísticas individuais como da diversidade de culturas. Por outro lado, tal como tem vindo a afirmar Anna Maria Guasch, existe na arte actual «um interesse renovado pelo real e valorização do estatuto de observador, de repórter, de artista comprometido em todos os domínios da vida humana.»3.


Quanto aos artistas da XX Bienal da Festa do Avante!, concorreram 124 artistas de todo o país com 225 obras, tendo sido seleccionadas 79 trabalhos entre colagem, desenho, escultura, fotografia, gravura, pintura e técnicas mistas, por um júri que foi composto por Jaime Silva, Manuela Bronze e Manuel Augusto Araújo. A exposição dos trabalhos vai poder ser visitada nos dias 1, 2 e 3 de Setembro na Atalaia, no Seixal. As obras apresentadas vêm uma vez mais demonstrar, afirmar e reivindicar essa autonomia e esse compromisso, pela sua diversidade e problematização da arte actual, opondo-se tanto ao padrão das instituições da arte contemporânea (galerias, museus, centros de arte, entre outros) como ao liberalismo económico, onde se privilegia a arte de mercado ou a mera exibição do acontecer, reduzindo por vezes a arte apenas a um fenómeno social.

No espaço das Artes Plásticas na Festa do Avante! deste ano vai também poder ser visitada uma Exposição de Colagem e Desenho «As Palavras Não Dizem Tudo», de José Araújo. As obras de José Araújo colocaram de imediato duas questões. A primeira diz respeito à técnica utilizada pelo autor, se era montagem ou colagem. No dicionário Oxford de Arte4 montagem é «uma técnica gráfica em que recortes e ilustrações são compostos e montados». Quanto à colagem, é aceite por vários autores que pode conter diversos elementos, pedaços de papéis, pintura, desenho, textos, tecidos e outros materiais tridimensionais, tendo como referência muitas das colagens dos cubistas, dadaístas, surrealistas, informalistas ou a colagem pop. Aproximando-nos de algumas opiniões em que as técnicas de montagem e a colagem não diferem muito, optámos por assumir integrar a montagem na técnica da colagem e fazer referência ao desenho que em alguns trabalhos está muito presente e a que chamámos Colagem e Desenho.

A segunda questão é que as obras de José Araújo nos remetem de imediato para uma abordagem estética e plástica da colagem utilizada pelo informalismo, e não fosse já o suficiente pela sua força e intensidade sígnica e compositiva no aproveitamento de texturas em papéis que já eram lixo, mas se as observarmos mais atentamente, principalmente nos conteúdos dos desenhos e dos recortes, transformados em signos e em símbolos, como se de objectos-poemas se tratem, revelando-nos uma intensa e profunda reflexão que o artista desenvolveu sobre as suas preocupações acerca do mundo e da arte.

  • 1. Rui Mário Gonçalves, «VII/1974-1980(?) ACÇÕES COLECTIVAS, NOVAS RELAÇÕES ARTE-PÚBLICO», in Pintura e Escultura em Portugal – 1940-1980, ICLP, 1980, p. 115.
  • 2. José Augusto Araújo no Catálogo da XX Bienal de Artes Plásticas da Festa do Avante!, 2017.
  • 3. Anna Maria Guasch, LAS PRACTICAS DOCUMENTALES ENTRE LO GLOBAL Y LO LOCAL, @anna maria guasch (2016)
  • 4. Ian Chilvers, The Oxford Dictionary of Art, Oxford University Press, EUA, 1988.

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